JORDÃO, O CABEÇA

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Jordão estava ali há horas.

Não sabia o tempo exato.
Olhava Max, o gato, a farejar o fundo do fogão.
Um rato se escondia na orelha esquerda, estremecendo a haste dos óculos.
Seus olhos, de tanto olhar à volta, pareciam os olhos de um lagarto.
Há três meses, alguém chegara. Seus sapatos-plataforma eram inconfundíveis.
Ela olhou bem dentro de seus olhos.
Sua mulher.
Foi para o canto oposto da cozinha. Ele não vira nada. De súbito, uma nuvem sobre sua visão.
Mas ouvia. Sua mulher, Dara, arrastava outro corpo. Sentia os braços macios e quase frios do outro corpo.
Parece que Dara fazia questão de juntar seu corpo ao da amante, por sinal, a irmã de Dara.
Por que ele não morria logo?
Porque já estava morto?
E aquele fedor pestilencial? Até quando teria de suportar?
Nesses três meses, estava sendo retalhado pouco a pouco.
Cada dia, um membro seu era cortado. Pra quê?
Por que sua mente não apagara? Por que esta dor eterna?
A mente dela teria sobrevivido?
Só sua cabeça e a da amante no centro da cozinha, agora.
Quem mandou escolherem uma casa tão isolada?

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