Necrofilia: uma rara parafilia - Necrophilia: a rare paraphilia

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• Revista Brasileira de Psiquiatria • vol 32 • nº 3 • setembro 2010

Caro Editor,
Desejo trazer a conhecimento o caso de BGL, 49 anos, solteiro, sexo masculino, aposentado e interno do Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico de Franco da Rocha-SP.
Segundo consta no inquérito policial, ele violou uma sepultura e vilipendiou o cadáver de uma mulher de 82 anos de idade introduzindo um cabo de vassoura na vagina dela no mesmo dia que a vítima foi sepultada. O acusado se encontrava embriagado e foi visto com uma garrafa de aguardente durante o sepultamento da vítima. No meio policial e entre os moradores de sua cidade era conhecido como necrófilo e tinha o hábito de violentar cadáveres homens.
Ao delegado de polícia, o acusado confessou o delito e disse que tinha atração sexual por pessoas mortas e que poderiam ser homens ou mulheres, não importava a idade, e que não se sentia atraído por pessoas vivas. Havia sido preso anteriormente por ter abusado sexualmente de um homem e uma mulher falecidos e, inclusive, praticou sexo anal com o cadáver masculino. Sentia-se muito excitado sexualmente diante de um cadáver e se masturbava. Os irmãos relataram que o interno não conseguiu ter aprendizagem na escola e nem trabalhar ou ter vida socioeconômica independente.
Aos 15-16 anos de idade furtou algumas vezes caixões de crianças de uma funerária, colocava-os na sala de sua casa, chamava as pessoas para um velório e então se descobria que os caixões estavam vazios. Houve menção de que tentava violentar o cadáver de uma pessoa que lhe provocava raiva quando viva. Em casa era calmo e cooperativo, não ingeria bebida alcoólica de modo frequente e nem usava drogas. Tinha tendência para homossexualidade e nunca teve namoradas. Quando jovem, teria sido violentado sexualmente por outro homem. Anteriormente, não se submeteu a tratamento.

ESTUDO DO CASO:

Necrófilos genuínos mostram evidência de psicose.
Álcool foi considerado um fator importante para vencer a inibição e cometer o ato (especialmente no grupo homicida), mas o diagnóstico mais comum foi transtorno de personalidade (metade da amostra). O uso de álcool contribuiu para o delito ocorrido no caso relatado e se mostrou congruente com a revisão desses autores.
Anil Aggrawal propôs uma nova classificação para necrofilia:
pseudonecrofilia (uma pessoa finge estar morta), necrófilo romântico, necrófilos platônicos ou fantasias necrófilas, necrófilos táteis, necrofilia fetichista, necromutilomania, necrófilos oportunistas, necrófilos regulares, necrófilos homicidas e necrófilos exclusivos. O caso relatado preenche critérios diagnósticos para necrofilia em associação com retardo mental moderado e abuso de álcool e pode ser considerado um necrófilo regular ou também chamado “necrófilo clássico” (preferência por contatos sexuais com pessoas mortas, embora possa ter contatos sexuais com pessoas vivas e mortas).

Roberto Moscatello
Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Professor André Teixeira Lima, Franco da Rocha, SP, Brasil, psiquiátrico de forma regular. O exame físico revelou dismorfia da face, biotipo displásico e obesidade. O exame psíquico revelou déficit de inteligência como transtorno significativo em associação com perversão sexual.

Necrofilia é uma rara e bizarra parafilia caracterizada por atração e gratificação sexual por pessoas mortas. Richard Von Krafft-Ebing é considerado um dos primeiros cientistas interessados em comportamentos sexuais anormais e, em 1886, ele considerava necrofilia como um comportamento perverso e que poderia ser decorrente de condições “neuropáticas ou psicopáticas”, como senilidade ou enfraquecimento mental adquirido. O caso relatado é congruente com a descrição de enfraquecimento mental e perversão sexual.
A literatura mais antiga associava necrofilia com severa
psicopatologia. Desrosières analisou 53 observações de casos descritos e encontrou 19% de debilidade mental, 13% de problemas neuróticos, 7,5% de epilepsia, 5,5% de depressão e 4% de psicose. Estas observações são concordantes com o caso relatado (presença de severa psicopatologia e retardo mental).

Referências

1. Hucker JS, Stermac L. The evaluation and treatment of sexual violence, necrophilia and asphyxiophilia.
Psychiatr Clin North Am.1992; 15(3):703-
19.
2. Burg BK. The sick and the dead: the development of psychological theory on necrophilia from Krafft-Ebing to the present.
J Hist Behav Sci.
1982;18(3):242-54.
3. Tridon P, Crombez Y, Vidailhet C, Paugain M, Boissemin JM. A propos d’un cas de nécrophilie approche structurale et psychophatologique.
Ann Med Psychol (Paris). 1984;142(7):1017-24.
4. Rosman JP, Resnick PJ. Sexual attraction to corpses: a psychiatric review of necrophilia. Bull Am Acad Psychiatry Law. 1989;17(2):153-63.
5. Aggrawal A. A new classification of necrophilia.
J. Forensic Leg Med. 2009;16(6):316-20.

3 Comentários:

fatti navarro disse... 12 de novembro de 2011 às 20:16

nossa, fiquei chocada , nunca imaginei que houvesse esse tipo de doença.

é muito bom se atualizar.

bjs!

Anônimo disse... 6 de fevereiro de 2012 às 22:01

Não é doença é uma parafilia '-'

Veronica disse... 29 de abril de 2012 às 17:55

Caso extremamente bem analisado, Parabéns!