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Outra Rachadura na Parede Por Phil Hine

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(Traduzido por Lizza Bathory a partir da tradução espanhola de Shaagar Snekersson de Condensed Chaos)

      Uma das características-chave da abordagem contemporânea da magia é o uso e exploração de técnicas práticas, cujo objetivo é provocar mudanças na percepção e atitude e ampliar nossas possibilidades de ação. Isto requer o desenvolvimento das competências e habilidades que formam a base de um trabalho mais avançado. O velho ditado de que “não podes correr antes que possas caminhar” é particularmente apto no que concerne à magia, onde é necessário ser capaz de desenvolver anteriormente determinadas técnicas para que possas fazer um uso mais eficaz de técnicas que assim exijam. Um exemplo bem básico disto é algo tão simples como permanecer sentado sem mover-se. Se és incapaz de sentar-te e ficar quieto e em silêncio, não terás muito êxito com nenhuna técnica mágica que exija, no mínimo, que te sentes e permaneça quieto. Muitos exercícios elementares de "treinamento" básico parecem triviais ou entediantes. A maior parte de nós provavelmente preferiria fazer algo mais estimulante e diferente do que sentar-se em uma postura estranha sem nada fazer. De certo modo, parte da motivação principal de tais exercícios é que sejam chatos ou aparentemente difíceis. Tais exercícios são um modo de provar os limites de tua Realidade Alcançável. Tu estás desafiando tua resistência inerente à possibilidade de mudança e ampliando as rachaduras na fachada da realidade fundamental.

D.R.A.T.

      As chaves para converter-se em mago são relativamente simples. Tão simples, de fato, que as pessoas tendem a descartá-las na busca por complexos sistemas de crenças e abstrações. Um exemplo de tal simplicidade é a fórmula DRAT para passar à ação:

      D – Disciplina
      R – Relaxamento
      A – Atenção
      T – Transformação

      Sem disciplina não aprenderíamos. Sem disciplina provavelmente não nos levantaríamos da cama pela manhã. Necessitamos de disciplina para vencer nosso maior adversário mágico – a inércia, que tende a aparecer na forma de vozes que influenciam nossa atitude argumentando que o que pode ser feito agora pode facilmente ser deixado para amanhã. Contudo, enquanto um pouco de disciplina nos ajuda a impulsar-nos para frente, demasiada disciplina pode nos conduzir à inércia, em especial se os objetivos que estabelecemos não são realistas. De modo que a disciplina requer Relaxamento, para ser bem utilizada. É possível estar relaxado e disciplinado simultaneamente. Para que a disciplina seja eficaz, precisamos estar relaxados e envolvidos. Se temos que sermos disciplinados e estarmos relaxados, então também necessitamos estar atentos. A atenção é uma habilidade. É difícil estar atento ao que ocorre ao nosso redor; é difícil estar atento a nossas próprias sensações corporais, hábitos de conduta e atitudes. É bem difícil estar atento a muitas coisas simultaneamente. Isto exige Disciplina e Relaxamento. A Transformação é a síntese e o resultado das outras três qualidades. Se somos disciplinados, então nos transformamos. Se estamos relaxados, nos transformamos, e se estamos atentos, nos transformamos. A Transformação exige Disciplina, Relaxamento e Atenção.

      A DRAT pode ser aplicada em uma ampla variedade de situações vitais, porém é especialmente útil ao aprender novas competências e habilidades que requerem prática e repetição. Uma boa parte do treinamento mágico é a aprendizagem de novas atitudes e habilidades que a princípio são aplicadas dentro do espaço ritualístico. De qualquer forma, é uma limitação ser competente e ter confiança somente dentro deste espaço. O truque está em ser capaz de aplicar estas habilidades e técnicas em áreas cada vez mais amplas da própria experiência, até que a magia não seja somente algo que tu fazes ocasionalmente, e sim um conjunto de princípios para tratar com o mundo pelo qual te moves.

Treinamento Corpo-mente

      O relaxamento é em si mesmo um bom ponto de partida para o treinamento mágico, porque junto a este, tens que ser consciente de teu corpo. Há uma grande tendência a olvidar o corpo e viver "dentro" dos próprios pensamentos, até um nível no qual parece que o corpo é algo que carrega nossas mentes de um lugar para outro. As abordagens ocidentais da magia, durante as últimas décadas, têm se tornado muito cerebrais e abstratas. O relaxamento é um bom contra-exercício para isto. Aprender esta habilidade pode ser considerado como o principio da Bruxaria – como um ato de desejar uma mudança na própria realidade. A técnica de relaxamento está em unificar o pensamento, a respiração e a ação. Em um nível bastante prático exige que entendamos a relação entre os pensamentos, os sentimentos e as mudanças fisiológicas no corpo.

      Com o passar dos dias tendemos a experimentar tensões de diversos tipos. Nossas respostas às mesmas são bem individuais – algumas pessoas desfrutam níveis de estresse que outros achariam difíceis de assimilar. Nossa capacidade para lidar com os fatores estressantes muda de acordo com as flutuações do ambiente. Os fatores de estresse são acumulativos, e a reação geral à sua sobrecarga é desencadear a resposta de combate: o fígado libera na corrente sanguínea a glicose armazenada, o coração bombeia mais rápido, os músculos se preparam para a ação e o sistema digestivo se fecha. Se o corpo está ativado para o combate, porém não há nenhuma possibilidade de resolução física ou psicológica, isso pode desencadear problemas crônicos. Por exemplo, a tensão muscular pode dar origem a dores e cefaleia. Um problema adicional é que, amiúde, não modificamos nossas expectativas acerca do que, de um modo realista, podemos conseguir, inclusive quando é necessário operarmos acima de nossas possibilidades. Isto é conhecido como Dissonância do Rendimento. Há uma brecha entre o que pensamos que podemos fazer e o que realmente pode ser feito. A luta para alcançar expectativas irreais reforça os sentimentos de ansiedade e baixa auto-estima, o que, por conseguinte, causa mais estresse no Corpo-Mente.

      Para ser capaz de relaxar de um modo eficaz, a capacidade de identificar os sintomas do estresse é necessária. Em segundo lugar, tens que examinar teus hábitos e atitudes e perguntar a ti mesmo se estes, mais provavelmente, reduzem ou aumentam o estresse. Deves estar preparado para mudar alguns fatores em teu entorno, no teu estilo de vida e em teus hábitos. Deves também estar preparado para aceitar que alguns fatores estão além de teu controle e devem ser tratados com outras abordagens.

      A ansiedade tem três componentes inter-relacionados que formam um loop de ansiedade. Em primeiro lugar, os fatores de Estresse fazem surgir a excitação fisiológica. (Pensamento: “Oh não! Me enfado de verdade quando isto ocorre”). Em segundo lugar, esta excitação é interpretada como ansiedade. (Pensamento “É como pensei! Tenho ansiedade!"). Em terceiro lugar, a identificação da excitação fisiológica como ansiedade desencadeia Auto-Afirmações Negativas (“Vou desmaiar/adoecer/fazer um barraco”). O que, consequentemente, leva a mais estresse.

      Então, como posso romper este ciclo de ansiedade? Novamente, um relaxamento eficaz requer três componentes. Em primeiro lugar, está o físico. Deve-se aprender a respirar de forma profunda e facilmente aplicar as técnicas de respiração simples da meditação básica é excelente, dado que são padrões de relaxamento muscular. Em segundo lugar, está o elemento Cognitivo. Este se relaciona com os pensamentos e sentimentos que surgem a partir das mudanças fisiológicas. É necessário ser capaz de identificar estes pensamentos habituais e alterá-los. Muito se tem escrito nos movimentos new age acerca da auto-sugestão e do "pensamento positivo", e estes elementos não devem ser descartados. É demasiado comum, entre nós, invocar deliberadamente a ansiedade através da visualização de uma situação potencialmente estressante e antecipar tudo aquilo que pode horrivelmente dar errado, preparando-nos assim para uma situação através da preocupação com ela. A assertividade reduz o estresse. Assim, ao antecipar uma situação potencialmente difícil, é mais efetivo visualizar-te fazendo uma avaliação otimista da situação, tentando encontrar abordagens adequadas e considerando possíveis alternativas. Atuar ou ensaiar por meio da visualização tende a fazer do real menos impressionante. Em terceiro lugar, está o elemento Comportamental. As formas como respondemos a situações estressantes são amiúde inadequadas ou inapropriadas. Ser capaz de relaxar significa usar tal habilidade em uma ampla variedade de situações, e também avaliar outras condutas e mudá-las. Um bom exemplo de modificação comportamental é conscientizar-se das tensões desnecessárias e eliminá-las. Os passos para relaxar descritos anteriormente têm muito em comum com outras habilidades mais "mágicas". Como técnica mágica essencial, o relaxamento versa principalmente sobre apresentar uma “alteração de acordo com a Vontade”, inclusive tal mudança aparentemente básica pode ter ramificações mais amplas. A relevância do Relaxamento para a magia já foi tratada em relação à Confiança. Também é bastante relevante para a prática da Bruxaria. Treinar o Relaxamento Consciente do Corpo demonstra quanto de nossa experiência corporal bloqueamos da consciência. Como exercício simples para ampliar a percepção corporal, tente focar tua atenção em distintas áreas de teu corpo. É muito fácil começar tal exercício quando estás completamente relaxado – focando a atenção nas pontas dos dedos das mãos ou dos pés. Podes também tentar este exercício em qualquer lugar. Se, por exemplo, estás levantado e muito consciente de teus doloridos pés, tente mover tua atenção para tua axila ou para a parte posterior de teus joelhos. Podes ampliar este exercício tratando de pôr tua atenção em tuas costas ou na superfície corporal tanto quanto seja possível.

Alterações Posturais

      Examina como tua postura te faz sentir. Andas encurvado, agachado, te contorces amiúde? Tente diferentes modos de caminhar: presunçoso, informal, maníaco, sexy. Aplique o conhecimento que obteves com tua prática mágica. Também, te conscientize dos padrões que adotas ao sentar-te. Seja consciente de tua própria linguagem corporal em relação à de outras pessoas. Observa se podes descobrir teus próprios hábitos posturais, e depois tente outros. Conduz isto a alguma mudança em tua conduta? Trata de adotar a linguagem corporal que sentes apropriada para as qualidades que desejas desenvolver. Também é útil estar atento a como respondem outras pessoas a tais mudanças posturais. Como uma evolução deste exercício, mantenha tua postura reta e relaxada (não é fácil – tente com o tai-chi ou a Técnica Alexander se tiveres dificuldades). Depois tente avançar para diferentes partes do corpo. Não as projetes, simplemente imagine que estás sendo estirado pela parte em questão. Para isto podes tentar com o quadril, o ventre, o peito, o nariz e a testa. Olvida tudo o que tenhas lido sobre os chakras e examina tuas próprias sensações.

Tornar Fácil

      Como uma extensão do treino do relaxamento, examine qualquer ação que realizes, não importa quão simples ela seja, e encontre a maneira mais fácil de fazê-la. Aplique este método às ações cotidianas – vestir-se, desvestir-se, pegar objetos, realizar tarefas rotineiras. Te encontrarás gastando muito menos energia, estando consciente do que estás fazendo, em vez de "apressar-te" em uma tarefa enquanto teus pensamentos se projetam até um futuro além da mesma. Quando tocares algo, ponha atenção na escova que são teus dedos sobre isso, sinta o objeto através de teus dedos e mova-o com a quantidade adequada de energia. Observe os objetos com uma apreciação justa e visualize o que queres fazer com eles, falando a maneira mais fácil de realizar isto.

      Tornar Fácil os exercícios demonstra como classificamos as tarefas em entediantes ou rotineiras, atos com os quais vamos tropeçando enquanto nos projetamos até um futuro mais interessante. Direcione tua atenção até ações que habitualmente pensamos que não valem a pena considerar: abrir uma porta, pegar um copo, cortar pão. Há uma maneira Fácil de Fazer todas e cada uma das coisas. Habitualmente não estamos conscientes da realização das tarefas simples até que ocorra algo que nos atrapalhe. Como a perda de um braço afetaria a tua vida diária?

Mover-se no Tempo

      Embora experimentemos o Tempo como uma dimensão separada, este é na verdade um subproduto da Consciência. Estamos movendo-nos constantemente para trás e adiante em termos de passado experimentado (memória) e futuros antecipados (fantasia). Ainda que grande parte da prática mágica tenha a ver com a capacidade de permanecer no presente imediato, também é útil ser capaz de fazer uso de nossos Passados e Futuros pessoais.

      Recorde momentos significativos, sinta a nostalgia ou reviva fatos passados que desencadearam emoções e mudanças psicológicas. Fazer isto requer a habilidade de montar uma sinergia de memórias sensoriais. Por exemplo, traga de novo à memória um/a antigo/a amante. Rememore um momento de contato visual e sinta a impressão que a excitação deixou em ti. Recorde a excitação de uma carícia, o espírito de uma voz, o palpitar de teu coração. Permita que teus sentidos se intensifiquem e conscientize-se das sensações corporais. Esta "evocação" da emoção por meio da memória tem inúmeras aplicações. Por exemplo, se tens um "assunto inacabado" com alguém de teu passado, podes evocá-lo e iniciar um diálogo. Outro uso desta técnica é trazer à tona uma emoção intensa e depois permitir que o que a tenha motivado vá se diluindo, enquanto intensifica a emoção, de modo que liberte-se de identificações prévias. Esta emoção "livre" pode ser usada para atos mágicos posteriores. Nos movemos adiante no tempo usando a fantasia, antecipando e ensaiando situações de acordo com a emoção e a expetativa. Se estás deprimido, então tenderás a deslizar-te até um futuro onde todos teus medos e o temor de um desfecho negativo das questões, tenham proeminência. A fantasia se converte em uma maneira de realimentação seletiva, reforçando e refletindo pensamentos até que nos "convençamos" da momentânea "correção" de um problema. De modo similar, criamos fantasias que efetivamente criam uma visão de um cenário "futuro" para o qual estamos nos movendo, porém isto está sempre, de um modo ou de outro, fora de alcance. No que concerne aos sistemas de valores ocultistas, esta tendência se manifesta em termos como New Age, a era de Aquário, o Æon de Hórus, o Caos, Bugs Bunny ou quem/o que desejes. Sempre que há uma projeção de futuro idealizada pela a qual estamos nos esforçando, esta permanecerá fora de alcance. A Grande Obra Mágica é a deformação do futuro até o presente imediato; o mago capta a realidade e vive o agora, livre das amarras de seu passado, e sabendo que o futuro é a manifestação de sua Vontade.

      Explorar e entender a própria relação com o Tempo é um requisito básico para a prática mágica. Num nível básico, isto implica a observação das mudanças na atenção e na percepção de acordo com os ciclos sazonais e diários. Tendemos a pensar em nós mesmos como imutáveis, apesar da hora do dia ou da estação do ano, porém estes elementos podem ter efeitos sutis em nós. Observa, comprende e faz o melhor uso possível das flutuações em tua percepção. Não há um único e objetivo Tempo que "esteja lá" aparte de nós, e subjacendo em nossa experiência "natural", há ocultas profundezas de complexidade e ambiguidade.

Diários Adicionais

      Como complemento ao diário mágico experimente um registro dividido em quatro colunas. Na primeira coluna registre os elementos físicos da tua jornada ou da situação. Na segunda, qualquer recordação que surja durante este tempo. Na terceira coluna, qualquer fragmento de alguma leitura/frase de um livro, periódico ou anúncio e, na quarta, qualquer fragmento de conversação que tenhas ouvido. Esta prática demostrará as conexões não-lineares que amiúde deixamos de dar atenção.

Sombras de Percepção

      Uma vez que comeces a observar por trás das cenas da experiência "normal", não há como parar. Assim como tendemos a experimentar o Tempo como uma dimensão objetiva, tendemos a pensar na percepção como algo passivo, uma ponte entre o "Eu" interno e o mundo exterior. A percepção é dinâmica; flutua e muda de acordo com o humor, o ambiente e o conhecimento. Há duas abordagens básicas para explorar a percepção, que devem ser caracterizados como estreitamento e alargamento.

Realçamento Sensorial

      A primeira abordagem envolve a exploração de cada modalidade sensorial de forma alternativa. Concentração em um Objeto é a capacidade de manter a vista fixa em um determinado objeto durante longos períodos de tempo. Alguma eficácia na Visualização é uma exigência básica para a prática mágica. Comece com formas simples e amplie para cenas mais detalhadas. Explora tua relação com as cores. Por exemplo, sei que vivo em um universo radicalmente diferente ao da maioria de meus congêneres dado que vejo as cores de um modo diferente. O sentido do olfato também desempenha um papel básico na magia. O olfato é uma linha direta para a memória e a associação. Observa como o odor evoca lembranças e construa tuas próprias associações entre perfumes, emoções e sistemas simbólicos para seu uso em experiências orquestradas. Expanda tua capacidade de ouvir sons focando em diferentes elementos sonoros. Passe uma semana escutando o timbre das vozes das pessoas. Há diferença entre o que as pessoas disseram e como disseram? Explore o sentido do tato tomando consciência de todos os objetos e tecidos. Explore as superfícies com teus olhos fechados. Em vez de ler ou falar enquanto comes, deixe que o sabor da comida ocupe tua atenção. Coma uma rodela de limão e um par de dias depois, evoque a recordação desse ato.

      Há numerosos programas mágicos de exercícios feitos para explorar alternativamente os sentidos, porém é mais fácil e divertido fazer os teus.

Gestalts Perceptivas

      Embora tendamos a isolar cada estímulo sensorial, nossa experiência real é a de uma Gestalt (totalidade). Estou escrevendo esta frase, comendo um cookie, consciente da cadeira contra meu corpo, escutando o passar dos veículos através da janela e sentindo a temperatura da sala. Ainda que a imaginação, como faculdade, tenda a ser tratada como principalmente visual, também podemos evocar propriocepções (pressão, temperatura), ações cinestésicas (orientação do corpo no espaço), odores, sons e sabores. Se, por exemplo, desejas imaginar-te remando na água, poderias montar uma gestalt perceptiva que, combine tua visualização da cena com a sensação dos pés na água, o movimento da água contra as pernas, o odor apropriado, a sensação do sol sobre tuas costas e uma trilha sonora.

      Montar e, portanto, criar tais cenas forma a base do que se conhece como Trabalho do Caminho (Pathwork). Desta forma, o mago constrói uma narrativa com um subtexto mítico ou instrutivo no qual adentra, identificando-se com a experiência até o ponto em que se converte em algo pessoalmente significativo. A montagem das imagens pode ser feita conscientemente ou pode ocorrer espontaneamente, dado que a mente tem a surpreendente capacidade de construir cenas complexas usando pouquíssima informação.

      Há, em geral, três tipos de Trabalho do Caminho: Estruturados, Semi-estruturados e Não-estruturados. Um exemplo do primeiro tipo pode ser visto no Capítulo Sete. Estes Trabalhos são narrativas completas, abordando pistas perceptivas, emocionais e comportamentais, que o usuário simplemente tem que seguir de maneira passiva. Estes Trabalhos do Caminho são especialmente úteis como exercícios de treinamento, em particular quando estás começando a trabalhar com um sistema de crenças que não te é familiar. São úteis se são gravados em uma fita de áudio ou, como é mais habitual, se são lidos por outra pessoa.

      Os Trabalhos do Caminho Semi-estruturados têm menos detalhes. Tendem a começar com uma "sequência de início" que estabelece o lugar (ou zona) a ser explorado, e por qual sentido estás ali, após o mesmo te deixar à tua própria vontade. Por exemplo, o narrador te conduz a um castelo estranho, dando-te pistas perceptivas suficientes para construir o entorno e depois te diz que deves buscar alguém que te dará uma chave para teu próprio poder mágico. Após o qual podes prosseguir como desejar. Esta abordagem te dá mais liberdade de movimento e criatividade no exercício.

      Os Trabalhos do Caminho Não-Estruturados ou espontâneos podem consistir em uma única imagem tridimensional, tal como uma carta de tarot, uma runa ou um hexagrama do I Ching. A ideia é usar o símbolo ou imagem como um portal ou entrada, e projetar-te através deste até a mítica paisagem que há além.

      No que podem ser usados os Trabalhos do Caminho? Fora o treinamento e a familiarização com um sistema de crenças, um de seus usos básicos é colocar-te em uma situação que desencadeia em ti reações cognitivas e emocionais quando chegas ao nível de identificar-te por completo com o que está ocorrendo. Um Trabalho do Caminho no qual morres, és enterrado e passas pelos diferentes estados de composição, te recordará, se é que não desencadeará algo mais, a inevitabilidade da morte, e talvez te ajude a trabalhar com teu medo da morte. Os Trabalhos do Caminho também podem ser projetados com "áreas livres" para realizar scrying, falar com entidades ou realizar feitiços.

Memória Cinestésica

      A consciência de nossa orientação no espaço e como nossos movimentos musculares se combinam ao realizar ações podem ser usadas para elevar a consciência do que geralmente se chama Corpo de Luz, Corpo Astral ou Duplo. Levanta teu braço esquerdo lentamente, estando consciente das alterações nos músculos, a débil resistência do ar e o movimento das articulações e ossos. Faça isso algumas vezes e depois evoque vividamente as sensações, enquanto imaginas que estás levantando esse braço. Teste isto até que consigas experimentar a elevação de teu braço esquerdo cinestético tão vividamente como o real. Se continuares experimentando esta prática com uma gama de movimentos e orientações corporais acabarás vendo que podes mover-te livremente com este corpo. O Duplo tem uma grande quantidade de aplicações mágicas. Pode ser usado para "ensaiar" tarefas ou situações potencialmente difíceis (como uma extensão ao relaxamento e ao Tornar Fácil). Também pode ser usado na mudança de forma e na invocação (ver Capítulo Oito) e também na exploração de sonhos e transes liminares.

O Templo Astral

      Construir um templo astral combina elementos de gestalts perceptivas e o uso de memória Cinestética. O templo astral é onde "vais", usando tua imaginação, para realizar atos mágicos. As descrições tradicionais dos templos astrais fazem muito uso de simbolismo hermético e quase maçônico, porém não há motivo que o impeça de desenvolver teu próprio templo usando o simbolismo e as ideias de base que sintas que são as mais apropriadas, como uma zona de ciberespaço, uma estação espacial ou um arranha-céu. O templo astral pode ser usado em todos os trabalhos de magia que normalmente realizarias no "físico", e como ponto de início para a exploração de mundos e paisagens interiores. Este é um reino onde o único limite é a extensão de tua imaginação. Com prática podes construir associações emocionais de modo que, quando entres nele, te acalmes, relaxes e te sintas no ápice do poder.

A Câmara Estrelar

      A Câmara Estrelar é uma esfera de cristal transparente suspendida nas profundezas do espaço. Suas dimensões podem ser ampliadas para adaptar-se a diversas necessidades. Para entrar na Câmera Estrelar, visualize a estrela do caos (caosfera) de oito raios girando em frente a ti, de modo que ela se converta em um vórtice giratório, que te levará até a câmara. No centro da mesma há um pilar cristalino que chega à altura da cintura. Se colocas tuas mãos sobre o pilar, a câmara brilha com um breve flash de luz púrpura e assim tens pleno controle de suas funções. A Câmara Estrelar é tanto um templo astral como um veículo para viajar através do multiverso. Podes mover-te até qualquer ponto no espaço-tempo pondo tuas mãos sobre o pilar de controle e estabelecendo tua vontade. Também podes extrair diversos dispositivos das paredes da câmara para realizar diversas tarefas – globos de scriying, gerar Servidores, estranhos projetores de energia para a projeção de desejos, ou defletores e coletores para acumular a radiação de buracos negros.

Transe e Percepção

      Entramos e saimos de diferentes graus de percepção continuamente ao longo do dia: sonhar desperto, fantasiar, concentrar-se em uma tarefa difícil, escutar música, estar tão absorto em uma situação que os sons de fundo desaparecem. Quando falamos sobre entrar em transe, estamos nos referindo a um ato deliberado ou intencional com a finalidade de alterar a percepção de acordo com parâmetros específicos. Na Sociedade Ocidental moderna tendemos a ter uma noção muito rígida sobre o que constituí um estado de transe – tendemos a pensar em alguém passivo, com os olhos fechados, lânguido ou não consciente de seu entorno. Tendemos a pensar em pessoas hipnotizadas (a palavra hipnose deriva de Hypnos – Deus grego do sono) como inativas, aguardando instruções. O termo "transe" é entendido amiúde como um estado de absorção tão profundo que toma a consciência da pessoa por completo. A capacidade de entrar e prolongar tais estados à vontade é um dos requisitos primordiais da vida mágica.

      Há muitas formas de alcançar o transe, a maioria das quais podem ser classificadas como técnicas Excitatórias ou Inibitórias. As Excitatórias – como a hiperventilação, dançar, cantar, tocar tambor ou qualquer outra estimulação intensa – quando se prolongam, proporcionam diversos efeitos fisiológicos e capacitam o mago a conseguir picos de êxtase nos quais a consciência de qualquer outra coisa que se pode ter na mente desaparece. É em tais momentos que os feitiços devem ser lançados e a essência de um deus, ou até mesmo crenças incrustadas na Mente Profunda (inconsciente), pode tomar forma e voz. As técnicas inibitórias servem para silenciar o diálogo interno, confundem o sentido linear de tempo e alteram os limites da noção de ego através da privação sensorial, privação de sono, jejum ou respiração lenta e rítmica. Todas estas técnicas têm diferentes efeitos fisiológicos e demonstram que a consciência física é uma necessidade essencial na magia. Um problema que adquirimos a partir de nossa cultura é que tendemos a ser demasiadamente “orientados por nossa cabeça" – detidos pelos contínuos comentários de diálogo interno e as palavras e imagens do Hiper-real. Neste sentido, uma personalidade estável se mantém por meio das transações, reais ou imaginárias, com outros. Desloca-te até algum lugar isolado e o eu se tornará mais maleável – outra clássica tática mágica para entrar em estados de transe. A personalidade que adquirimos estabelece os limites do que podemos ou não fazer. Amiúde, através de estados de transe, sejam intencionais ou não, podemos realizar proezas ou tarefas que estão normalmente fora do repertório normal. Se a consciência auto-referencial é congelada por meio de uma comoção, ou a distraímos, o corpo parece tomar o controle, movendo-nos para fugir do perigo. Nos agrada pensar em nós mesmos como estando "no controle" de nossos corpos. Isto é em si um problema, já que "deixar-se ir" e desinibir-se (especialmente em um trabalho em grupo) é muito difícil para alguns de nós – deixar tudo de lado é, em geral, algo que causa desaprovação. Noutras culturas, de qualquer maneira, a desinibição é aprovada e é sinal de um evento afortunado. Aqui está a descrição de Luciano de uma Sacerdotisa de Delfos entrando em transe:

      "Avançada tropeçando freneticamente ao redor do santuário, com o deus montado na nuca, golpeando-se com os tripés em seu caminho. Eriçou o couro cabeludo e, quando sacudiu a cabeça contra as colunas, as grinaldas foram de encontro ao solo desnudo… sua boca espumava com frenesi; grunhia, ofegava, pronunciava estranhos sons, fazendo seus lúgubres gritos ressoarem na enorme caverna. No fim, Apolo a forçou a uma fala inteligível."

      Entrar em transe não é sempre uma experiência prazerosa, especialmente nos estados de transe que implicam possessão. A sensação de que algo está usando teus membros e de que tua voz não te pertence é muito estranha. A tendência natural, especialmente para os ocidentais, é resistir à experiência, inclusive quando o espírito entrante é benévolo. Geralmente, a pessoa possuída não tem recordações ou consciência do que lhe ocorreu. Os magos têm, ao longo de eras, recorrido a drogas, a intenso esforço físico ou a longos rituais para anular temporariamente a personalidade, tornando a possessão mais fácil.

Para Que Entrar em Estados de Transe?

      Aqui há umas boas razões:

      1) Conhecimento (que não se pode obter de outras maneiras). Isto abarca desde perguntar à tia Freda como é o outro lado, a até formular uma pergunta específica acerca das ervas a um determinado espírito de cura. Isto pode às vezes envolver viagens a determinadas partes dos mundos interiores para consultar uma entidade específica.

      2) Melhora das Habilidades. Ser possuído por um deus da guerra melhora a eficácia marcial ou a autoridade sobre outros espíritos. Por exemplo, tive uma cliente que apresentava um recorrente problema na garganta. A examinei sob um ligeiro transe de "visão" e vi uma criatura parecida com um sapo que havia inchado e se hospedado em sua garganta. De modo algum ela ia sair voluntariamente. Meus guias me aconselharam (novamente sob transe) que a única entidade à qual o espírito respeitaria seria um sapo ainda maior, de modo que realizamos uma cerimônia de cura durante a qual fui possuído por um espírito-sapo, com o objetivo de interagir com o da garganta de minha cliente.

      3) Êxtase Comunal. O mago aborda uma tarefa muito importante para a tribo ou comunidade – mediar entre o mundo cotidiano e o mundo, maior-que-a-vida, o mito e a sabedoria popular. O mago se envolve, ou permite a outros que o façam, na sagrada participação mítica atuando como o guia – navegando as sendas secretas da cosmologia da comunidade. Isto reflete uma das maiores armadilhas na hora de assumir papéis mágicos em nossa cultura – o fato de que a sociedade ocidental tem um repertório extremadamente complexo de imagens míticas para usar, isto não deve fazer com que os mundos mágicos interiores sejam menosprezados. Por exemplo, um xamã Tamang do Tibete participa de um mundo mítico compartilhado com outros membros da comunidade – sua história, mito e relatos acumulados –, atualizado e intensificado por anos de treinamento, visões e ritos. Isto contrasta com o mundo mítico ao alcance de alguém na Grã-Bretanha moderna – uma Ilha que tem sido durante séculos um caldeirão de diferentes culturas, com as armas eletrônicas do videodrome fornecendo informação de todos os cantos do planeta, tanto através da distância como do tempo. É possível para alguns ter uma boa compreensão a nivel acadêmico das crenças xamânicas Tamang, sem mencionar a ficção científica, a fantasia, a mitologia, a educação e a miríade de modos de expressar as ocupações espirituais. Além disto, a sociedade moderna há tendido a ceder o reino do mítico aos profissionais: terapeutas, artistas, filósofos – e estamos em grande parte apartados da participação no mundo mítico, exceto (frequentemente) nas rotas de escape aprovadas e desinfectadas que apoiam a realidade consensual, inclusive oferecendo a ilusão de opor-se a ela. De qualquer forma, tudo isto conduz a uma vida mítica bastante complicada. Afortunadamente, algumas imagens e processos míticos, tais como a Viagem ao Submundo são bastante universais. Outras, de qualquer maneira, "perdem-se" ao serem olvidadas ou mutiladas as rotas que conduzem à sua experimentação/compreensão. Confiamos tanto na "luz diurna de segunda mão" – ler e observar a experiência de outra pessoa – que a transmissão oral do conhecimento é comparativamente rara. O primeiro Coven de Bruxas no qual estive envolvido estabeleceu um bom padrão – quando a sacerdotisa queria transmitir a "sensação" da magia, íamos a um espaço aberto – um parque, uma rua iluminada pela lua ou à beira do mar. A experiência física, direta, especialmente quando estás acompanhado por um guia que não vá ferrar-te, é sempre melhor que estar sentado dentro de casa lendo um livro! De qualquer forma, estou divagando.

      4) Conectividade. Isto está relacionado com a realização de conexões – descobrindo ligações entre diferentes ideias e elementos; fazendo um salto criativo que aflora um fluxo de novas ideias e entusiasmo. Amiúde entro em transe para superar o bloqueio na escrita – deixando com que fragmentos de conversação, poesia ou imagens deslizem através de meu olho interior. Algo emana a partir das ideias e conexões, saltando como aparas metálicas em direção a um ímã.

      5) Demonstração de Habilidade. Em nossa cultura, tu podes ser capaz de afugentar, como mago, pessoas impressionáveis por ter investigado as obras completas de Aleister Crowley (que façanha!). Aos aspirantes a mago não obstante, pode ser requerido que entrem em estados de transe como demonstração de sua eficiência. É bastante comum para os espíritos pôr-te à prova submetendo-te a uma pressão psíquica extrema, de modo que a experiência se converta em uma versão compacta da iniciação ao submundo. Alguns espíritos, demônios e deidades não pouparão esforços para confundir-te, cedendo sua sabedoria somente quando tiveres provado estar à altura da tarefa. Os espíritos dos psicotrópicos estão especialmente inclinados a este tipo de comportamento.

      Não podes converter-te em mago isolando-te de todos os demais, embora sejam necessários períodos de isolamento deliberado de vez em quando. Ademais, não há muitos instrutores de magia vagando por aí (não ao menos sem que te empenhes em uma ronda interminável de seminários de fins de semana), de modo que terás de aprender com tudo e todos. É importante aprender a reconhecer o início de alterações na consciência e explorar todas as possíveis rotas de transe. Aprenda a confiar em tuas próprias sensações e em tua intuição, mais do que no diálogo interno ou no que pensas que “deverias” fazer.

      Novamente, estas técnicas servem para libertar a consciência das limitações da percepção linear e do tempo solar. Fixe-se em um espelho, observando teu reflexo até que o espelho se escureça e te sintas deslizar para dentro dele. No princípio pode parecer dolorosamente difícil devido ao desejo egóico de querer saber demais. A noção tempo terá passado. O ego necessita do sentido de tempo passando para manter-se compacto como uma entidade "fixa". Qualquer técnica que sirva para transtornar a consciência linear e o diálogo interno, conduzirá o mago a um estado chamado de Percepção Liminar.

      A percepção liminar é um estado fronteiriço da consciência. Uma rota a este estado perceptivo é o estado meio-desperto, meio-dormindo que geralmente surge a partir do esgotamento físico. As imagens ou os sons surgem na consciência, aparentemente de "qualquer parte", além da própria vontade. Uma técnica útil para ser eficiente em entrar neste estado é a scrying.

Scrying

      Scrying é uma técnica divinatória básica útil para explorar a percepção liminar. Ela pode ser realizada usando-se qualquer superficie refletora, como um espelho, preferivelmente uma superfície negra brilhante, ou uma tigela cheia de líquido negro. A scrying requer que sejas capaz de entrar em um ligeiro estado de transe onde as imagens surjam em tua mente, como devaneios, ou como as imagens que vês antes de cair no sono. O truque da scrying é tentar relaxar e deixar que qualquer imagem apareça diante de ti, observando fixamente o meio que estás usando, sem olhar com excessiva intensidade ou com demasiada concentração. Isto ocorre somente com a prática. A princípio deve bastar deixar que surjam imagens ao acaso, e mais tarde tentar responder questões específicas. A área na qual for a praticar deve estar tenuamente iluminada, e as luzes (velas são excelentes, sendo menos agressivas que as luzes elétricas) devem estar localizadas de modo que não sejam refletidas no meio de divinação escolhido. O incenso também pode ser útil, em particular as resinas e óleos que atuam como relaxantes. Podes achar útil realizar um exercício de meditação ou relaxamento antes de tentar a scrying. Técnicas divinatórias como esta ajudam a desenvolver as faculdades psíquicas e intuitivas, e o truque de relaxar e deixar que as imagens surjam em tua mente é também uma chave para outras habilidades como a psicometria e a leitura de aura. Uma vez que tenha experimentado o método básico, a prática regular te ajudará a desenvolver novos métodos. A observação de espelhos e cristais é uma potente tradição mágica, sendo encontrada nas culturas xamânicas das Américas até a África, Europa medieval e Grécia Antiga. Os espelhos e cristais não foram usados somente para adivinhar o futuro, e sim como meio de comunicação com os espíritos ancestrais. Ocasionalmente alguém vê cenas ou entidades saindo da superfície refletora e misturando-se com o entorno.

Sonho Dinâmico

      Explorar as possibilidades do Sonho Mágico é uma maneira poderosa e eficaz de apartar-se da consciência linear e permitir a magia dentro de tua vida. Os futuros magos podem inclusive serem identificados pela virtude do conteúdo de seus sonhos e não é incomum que conversem com seus guias nos sonhos. Tendemos a pensar neles como um aspecto muito pessoal de nossa experiência, de modo que a vezes é desconcertante quando alguém que conhecemos aparece em nossos sonhos. Neles, o tempo histórico é abolido e a distância não importa. Podemos ser testemunhas de fatos do passado, futuro ou presentes alternativos.

      Os sonhos são um ponto de partida útil para penetrar nos mundos internos. Pode ser adequado para induzir sonhos proféticos ou encontros com espíritos de modo que possas discutir algum problema. Uma amiga minha que faz incensos e perfumes conta que ocasionalmente sonha com um único odor, o qual, ao despertar, pode analisar e manufaturar. O artista mágico Austin Osman Spare escreveu que, às vezes, ao despertar encontrava-se plantado em frente a uma pintura acabada, tendo a desenhado enquanto dormia.

Mantendo um Diário de Sonhos

      O primeiro passo para explorar a magia dos sonhos é manter um registro dos teus, que deve ser, se possível, atualizado assim que despertes. Ao longo do tempo isto melhora a capacidade de recordá-los com um detalhamento cada vez maior. É também muito valioso para comprovar o grau de confluência entre as imagens oníricas e a experiência de vigília. Ter um diário dos sonhos também te tornará capaz de identificar os símbolos recorrentes, as imagens e situações que aparecem em teus sonhos e que podem formar a base para a exploração voluntária de zonas astrais ou para a prática mágica enquanto desperto, baseada nas imagens dos sonhos.

Controle Básico dos Sonhos

      É extremamente fácil fazer com que o conteúdo dos sonhos se molde ao esperado. Pessoas que estão sendo submetidas à análise freudiana tendem a ter sonhos "freudianos", enquanto que aquelas que realizam psicoterapia junguiana tendem a experimentar sonhos junguianos. Tu podes optar por iniciar a experimentação com o Controle dos Sonhos estabelecendo um "tema" para os mesmos – como um determinado assunto, localização ou pessoa. Há várias abordagens diferentes para guiar intencionalmente o conteúdo dos sonhos. Em primeiro lugar, antes de dormir, realize um exercício de relaxamento e formule claramente a Declaração de Intenção em relação à tua experiência onírica. Por exemplo, “É minha vontade sonhar com meu pai”. Uma vez feito isto, podes permitir que tua mente "vague" até que durmas. Alternativamente, podes visualizar uma cena ou imagem enquanto adormece. Não há por que ser uma visualização intensa, apenas o objeto de tua atenção ao cair no sono.

      Uma terceira opção para obter o conteúdo onírico desejado é usar um sigilo gráfico ou mântrico, utilizando as técnicas citadas no Capítulo Cinco. Independentemente de técnica que uses, recordes que o objetivo não é impor tua vontade nos pedidos, e sim estar relaxado ao mesmo tempo que se formula a intenção.

Telepatia em Sonhos

      A possibilidade da transmissão de informação telepática nos sonhos tem sido o tema de uma boa quantidade de investigação parapsicológica, habitualmente na modalidade de um “transmissor” tratando de projetar algum tipo de informação para o sonhador. De qualquer forma, pode ocorrer de teres um sonho sobre alguém em uma situação específica, que este alguém experimente. Consequentemente, a única forma de saber se um sonho tem ou não conteúdo telepático é ir até à(s) pessoa(s) implicada(s) e comprovar se teu sonho tem algum significado para ela(s). Outra possibilidade é estabelecer um vínculo telepático entre ti e a outra pessoa por meio do olfato. Se duas pessoas usam uma determinada fragrância ou perfume, até o ponto em que o aroma evoca a imagem do outro, isso pode ser usado para criar um vínculo onírico. Se o aroma é inalado antes de dormir, enquanto se está relaxado, formulando a imagem da outra pessoa, e se faz uma Declaração de Intenções para o sonho, então é possível que a outra pessoa possa experimentar esse odor em seu sonho, e que fique mais receptiva à experiência telepática. Eu usei essa técnica em uma série de experimentos, onde uma namorada e eu descobrimos que podíamos despertar um ao outro num horário pré-estabelecido da noite, usando um aroma como "ativador" do sinal telepático.

Sonhos Compartilhados

      Um sonho compartilhado é um evento no qual duas ou mais pessoas experimentam o mesmo sonho ou elementos similares. Alternativamente, poderias sonhar contigo e outra pessoa, e mais tarde saber que a pessoa ou pessoas também sonharam que estavas contigo, talvez em um contexto diferente. Novamente, o único modo de validar isto é contando às pessoas implicadas. Tentar organizar grupos de sonhos compartilhados pode ser um exercício interessante, talvez usando um Trabalho do Caminho Semi-estruturado que abranja o ambiente básico com o qual os participantes possam mais tarde sonhar.

Sonhando com o Futuro

      Que os sonhos têm o poder de avisar-nos sobre o futuro é uma ideia antiga e os sonhos premonitórios tinham um importante papel nas civilizações antigas. Com base em um sonho, o destino de um país ou estado pode ser formado. Os sonhos sobre o futuro podem ser simbólicos, distorcidos ou até mesmo altamente detalhados e nítidos, porém amiúde é difícil distinguir de antemão os elementos importantes do mesmo. Há alguns anos, uns amigos meus decidiram empreender um experimento sobre sonhar com o futuro. Planejaram uma visita a uma cidade que nenhum deles havia visitado antes, e então trataram de sonhar com a visita. Um deles viu um gato de pescoço longo, porém não imaginava como isto poderia ser relevante. Quando finalmente visitaram a cidade, uma das primeiras coisas que viram após sair do carro foi uma antiga loja. Na vidraça havia um modelo de cristal de um gato de pescoço longo.

Sonhos Lúcidos

      A lucidez ao sonhar é o momento em que percebes que estás sonhando e já não continuas experimentando o sonho passivamente, e pode então alterá-lo/controlá-lo. Os momentos de lucidez podem ser ativados por meio de diferentes coisas. Por exemplo, uma vez sonhei que estava em uma casa na qual não vivia há uma década. O sonho era perfeito em cada detalhe, exceto que quando baixei a vista para meus pés, vi que usava um par de sapatos que já não possuía naquele momento. Esta incongruência me perturbou de modo que me dei conta de que estava sonhando. A lucidez também pode ser ativada por meio do reconhecimento de elementos oníricos. Não é incomum para os sonhadores, em geral, perceber que já haviam tido aquele sonho antes, recordando como ele se desenrola, e assim decidindo não experimentá-lo de novo. Tendemos a experimentar momentos ou flashes de lucidez nos sonhos, porém é possível, por conseguinte, ampliar esta habilidade, capacitando-te a dirigir o conteúdo do sonho com propósitos mágicos. A lucidez pode ser produzida usando a sugestão enquanto se está desperto ou, de um modo oblíquo, por meio de metaprogramar-se de forma que se apareça uma determinada imagem ou cena, isto a ativará, isto é, “Estarei lúcido no momento em que ver uma esfera amarela flutuando até mim”. A esfera pode ser controlada por outra pessoa, ou atuar como um Servidor (ver Capítulo Seis) projetado para ativar sonhos lúcidos. Pode ser gratificante abordar o sonhar de um ponto de vista não-ocidental, tal como o dos Senoi, aborígenes australasiáticos da Malásia. Alguns antropólogos crêem que a psicologia dos sonhos dos Senoi é a fonte da tranquilidade de suas vidas. Na primeira vez que foram contactados pelos ocidentais, nos anos 30, não tinham crimes violentos ou conflitos em sua comunidade há duzentos ou trezentos anos.

Axis Mundi

      O Axis Mundi é o ponto central que une todas as zonas de experiência e os estados de consciência. Ele possui muitas representações simbólicas tais como a Árvore do Mundo, a Montanha Sagrada, o Mastro (Falo) ou a Encruzilhada que são o centro do universo do mago. Não é em si um lugar, e sim uma questão de como te "localizas" em ti mesmo. Estar relaxado no presente significa que estás no centro de tua realidade mágica. O ato de centrar-te em ti pode tomar a forma de um elaborado ritual de banimento, ou um momento de não-mente no relaxamento antes de iniciar a tarefa. Os elementos principais desta centralização são simples:

      1. Prestar atenção em tua presença física.

      2. Estabelecer as entradas, pontos cardeais ou dimensões (de acordo com o esquema de representação que escolhas) nas quais estás teu centro.

      3. Auto-identificação com uma fonte de inspiração escolhida – mesclando o macrocosmos (experiência total) com o microcosmos (eu). Um exemplo de Ritual de Banimento ortodoxo é dado no Capítulo Seis. Os exercícios de centralização devem fazer surgir uma sensação de relaxamento e de estar preparado para a ação. Estes podem abarcar desde elaborados banimentos que são usados como preparação para um intenso ritual, a até simples exercícios que podem ser usados em qualquer lugar e em qualquer momento.

      O Axis Mundi também pode ser considerado o ponto de acesso a diferentes mundos internos da cosmologia mítica. Parece razoável supor que a Árvore da Vida cabalística evoluiu a partir da xamânica árvore do mundo. As encruzilhadas são outro símbolo do Axis Mundi, que aparecem nas mitologias celtas, gregas e haitianas. Os mundos internos estão povoados por uma multidão espíritos, demônios e antepassados. O contato e a ciência destas entidades é parte da totalidade da experiência de uma sociedade tribal mediada por xamãs. Isto raramente ocorre na cultura ocidental – há uma vasta variedade de mundos internos que podem ser explorados. A Mente Profunda é muito receptiva à sugestão (no fim das contas, é assim que aprendemos), e pode ataviar-se com qualquer tipo de imagem. Usando o templo astral e as técnicas de formação corporal citadas anteriormente, podes explorar qualquer mágico mundo interior, desde as míticas paisagens dos deuses nórdicos aos prístinos jardins que podem ser penetrados através dos trigramas do I Ching.

A Vontade Mágica

      A consciência surge da percepção, a qual emerge de nossa interação com o entorno. A Vontade pode ser entendida analogamente como a interação da intencionalidade ao longo de um dado vetor. Quando dizes: “É minha Vontade o…” estás projetando o futuro. A Vontade Mágica não deve ser confundida com a chamada força de vontade ou concentração. Não há nenhuma utilidade em obrigar-se a passar por rigorosas provas, juramentos ou promessas se o desejo de superar um hábito ou conduta é mais fraco do que o desejo de mantê-lo, se é assim seguramente falharás e deste modo reforças tua sensação de ser débil.

      A chave da Vontade está no relaxamento em relação ao presente, na unidade do desejo e na unidade do propósito. Como verás no próximo capítulo, ser competente na Feitiçaria requer que possas isolar, identificar e focar-te em alguns desejos específicos, enquanto, ao mesmo tempo, te desapegas deles. Os desejos se manifestam quando são isolados, exteriorizados e depois olvidados. Os atos de rituais mágicos, que envolvem a coordenação da percepção e da ação ao longo de um vetor direção, servem como exercícios de unidade de propósito. Por exemplo, eu projeto uma intenção: visualizo o sigilo que representa meu desejo. Lentamente levo minhas mãos adiante, como se o ar oferecesse resistência ao meu movimento. Ao mesmo tempo, visualizo um feixe de energia saindo de minha mão. Exalo com um grito de “Kia”. Todas estas ações estão unidas em um único propósito de projeção no futuro. Assim, palavra e fato são unos. Realizar tua vontade requer uma mente relaxada e centrada, focada no propósito, enquanto te desapegas dos resultados que tentas atrair. No Budismo Zen, isto é conhecido como “Sabedoria Inamovível”, onde a mente de alguém é liberada das amarras e laços do passado e da antecipação do futuro. Esta prática não é fácil para a maioria de nós, e requer muita paciência, disciplina e prática. O refinamento da Vontade Mágica surge da prática e a vigilância constante contra o cair em padrões de pensamento e conduta habituais. O valor das práticas de meditação simples, como as que são citadas na prática do Zen não deve ser descartado, dado que elas podem ser de grande ajuda no desenvolvimento da consciência do corpo-mente, e na consciência do presente imediato. Muitos magos modernos praticam algumas formas de artes marciais e tais práticas são de grande valor para desenvolver habilidades mágicas.

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Este texto foi extraído do livro Condensed Chaos.

A Deriva Mágica, por Stephen Grasso

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      O termo dérive, ou “deriva” foi cunhado pela primera vez pela Internacional Situacionista, referindo-se a largas caminhadas sem objetivo ao redor de seus povoados e cidades, reimaginando as torres residenciais, cenotáfios e fontes públicas como se tratassem de castelos de sabedoria, cercas sussurrantes e reservatórios da eterna juventude.

      O propósito da deriva era ver beleza na paisagem urbana e conquistar a tirania da planificação austera e opressiva, através do poder transformador da imaginação. Através da técnica da deriva, os situacionistas podiam mudar radicalmente sua experiência de cidade e converter acinzentados espaços urbanos decadentes em paisagens mágicas de maravilha e encanto sem limites. Ainda assim, quiçá interromperam demasiadamente a finalização do exercício, em vez de levá-lo à sua conclusão lógica.

      Uma vez que se há despido a camada de cinzas urbanas e descoberto um mundo mágico cheio de espíritos, a fase seguinte é ver o que podes fazer com esse mundo, como podes conversar com estes espíritos e averiguar o que podem fazer por ti.

      A técnica da deriva não somente revela magia, e sim um processo de vínculo com esta. Há muitas aplicações distintas, e pode ser usada numa variedade de contextos. Pode ser utilizada como um método de comunicação direta com o “genus loci” ou espírito de um lugar em particular ou de uma área geográfica mais ampla, ou como forma de diálogo com qualquer entidade com a qual estejas trabalhando. Pode servir como um método de recolhimento de potentes ingredientes e materiais para rituais, ou para buscar respostas de questões divinatórias. As aplicações práticas da deriva são numerosas, e o mago imaginativo descobrirá sem dúvida muitas mais. Pode levar-se a cabo praticamente em qualquer lugar e momento; assim, é ideal para situações nas quais não estás preparado e queres improvisar alguma forma de magia poderosa.

      Os mecanismos da deriva são simples. Estás tentando caminhar entre mundos e atrair algo útil. É em essência uma viagem xamânica que tem lugar no tempo real, como o oposto ao conceito de viagem interna (como os transes de percussão de tribos indígenas como os jivaros). A deriva te força para fora do teu cômodo templo com calefação central e te põe no mundo como muitas poucas práticas no ocultismo. Lança tua magia para o mundo, num sentido muito real e muito físico.

      Uma deriva pode começar de muitas maneiras, dependendo da situação e do objetivo. Às vezes as derivas podem ser espontâneas. Se tiveres internalizado a prática o suficiente, não será raro ver-te arremessado virtualmente a uma deriva xamânica em algum momento. Ir pegar um pacote de leite, voltar para casa após o pub ou ir às compras pode transformar-se frequentemente em forte magia de um minuto para outro. A deriva espontânea pode elevar tua sensibilidade e adaptabilidade a um grau muito alto, porém para obter melhores resultados, tens que ser capaz de receber e filtrar “informações” de forma efetiva. A deriva é uma prática ocultista de alto risco no que diz respeito à tua saúde mental, já que favorece um nível de abertura para a comunicação espiritual que pode amedrontar. Antes que te dês conta, serás o louco que fala com coisas invisíveis pela rua e busca nas lixeiras segredos ocultos. Isto caminha bastante unido a esta forma de trabalho, assim antes de começar, é bastante útil aprender um método de ativá-la e desativá-la.

      É importante recordar que o que estás fazendo é tentando “caminhar entre mundos”, com ênfase na palavra “entre”. É relativamente fácil acabar em queda livre com esta prática e converter-te rapidamente em um lunático paranóico, porém não é o que se pretende. É tua habilidade como feiticeiro o que te permite navegar com segurança por áreas mais selvagens da consciência e trazer algo útil na volta. Para conseguir assentar a prática da deriva, hás de desenvolver suficiente capacidade para o momento de mediar entre tua existência normal do dia a dia e a experiência hiper-real xamânica.

      Para iniciar a deriva, uma boa ideia é buscar um lugar adequado; um ponto físico de acesso que te permitirá entrar na realidade xamânica e regressar quando o trabalho estiver finalizado. O ponto mais imediato e acessível para a realidade xamânica é, supostamente, a encruzilhada. Qualquer lugar habitado terá uma encruzilhada com um outro aspecto bastante próximo, e a encruzilhada é o símbolo supremo da intercessão entre os mundos. Todavia, qualquer trabalho relacionado com as encruzilhadas cai dentro do território de diversos Deuses, Deusas, Santos, Espíritos e Mistérios associados com elas. Necessitas pedir-lhes permissão antes que possas atravessar o umbral. Isto é mais simples de se conseguir se já manténs alguma relação com uma ou mais destas entidades. O modus operandi genérico seria fazer-lhes oferendas adequadas e perguntar se abrirão o portal para ti, permitindo-te atravessá-lo e alcançar o intento de tua deriva. Deves buscar sua bênção para tua viagem e pedir-lhes que se assegurem de que voltes são e salvo.

      Os mistérios das encruzilhadas são essenciais para operar com isto; é possível ainda assim iniciar uma viagem xamânica com um estilo mais livre, utilizando uma entrada física como uma porta, um arco, um beco estreito ou uma rota que simbolicamente seja similar, já que estas estruturas ainda estão sob o domínio da “cruz dos caminhos/encruzilhada” em um nível esotérico. Se toda a operação ocorrer sob os auspícios específicos de uma entidade própria de uma encruzilhada, tanto com sua permissão como com sua implicação, é bastante provável que obtenhas resultados muitos melhores. Uma vez que tenhas efetuado as oferendas e recebido permissão, podes iniciar a deriva. Atravesse o arco/porta/etcétera de teu lugar de partida ou saia da encruzilhada por algum caminho distinto ao pelo qual chegaste. Agora estás entrando na realidade xamânica.

      Nas primeiras etapas da deriva deves começar a conectar-te com teu entorno. Prestes atenção ao que está acontecendo ao redor e tentes ler a língua da cidade, ou do lugar no qual estejas. Busques grafites estranhos, títulos em cartazes velhos, palavras estranhas ou frases que saltem sobre ti, o que em outro caso seriam fontes inócuas, etcétera. Prestes atenção aos pedaços de conversação que escutes, às letras das canções que surjam dos rádios dos carros, ou aos anúncios das estações de trens. Estás buscando um signo ou um sinal que possa ser interpretado em relação ao teu intento, tua intenção na viagem. Não tentes forçar-se a fabricar algo que coincida, relaxa-te e espera que algo surja por si mesmo. O processo da deriva é um diálogo com os espíritos.

      Talvez tenhas que ser paciente, porém saberás quando estiveres sobre a pista correta. A primeira parte da informação que chegar até ti responderá tua pergunta, assim como te enviará à etapa seguinte em tua viagem. Às vezes as derivas podem resolverem-se rapidamente; por exemplo, minutos depois de deixar o ponto de acesso, vês uma parte aleatória de arte urbana que responde à tua pergunta em termos inequívocos. Se isto ocorre, somente tens que retornar à encruzilhada, agradecer aos espíritos e pedir-lhes que fechem a porta para ti. Às vezes é tão simples assim. Todavia, amiúde o primeiro sinal que receberás te enviará a algum outro lugar, ou somente te contará parte da história, de modo que continues e busques mais pistas. Podes chegar a certo ponto no qual tenhas a sensação de estar seguindo uma linha/trilha simbólica através da cidade. Cada signo que recebes te leva um pouco mais até teu destino e à realização de teu intento. Ocasionalmente podes perder a trilha completamente e encontrar-te sem ter ideia de onde ir. Se isto ocorrer, relaxe e tente “conectar-te” novamente, retornando à trilha para seguir o rastro correto.

      Ocasionalmente os espíritos te arranjarão alguma pista um tanto retorcida; por exemplo, pode ser que encontres um fragmento de mapa que sugira com força que tens de pegar um ônibus até o outro lado da cidade para acabar tua busca. Ou podes ver-te em uma viagem elaborada e esgotante através da cidade, para acabar vendo que o que buscavas se encontrava em frente à porta de teu edifício. Em uma deriva, pode ocorrer qualquer coisa. Estás entrando em uma zona de elevado potencial, e deves estar preparado para qualquer coisa.

      Um dos maiores obstáculos para que uma deriva tenha êxito é teu ego. A mensagem da deriva pode ditar-te claramente que deves fazer algo que parte de ti recusa. Pode pedir-te que roubes algo que se destaca em um lugar público, ou que te comportes de uma forma realmente singular em um local extremadamente inapropiado. Amiúde, tudo o que se pode fazer em circunstâncias como estas é ir além do que teu condicionamento social te limita e… ter fé na magia. É surpreendente até que ponto podes fazer coisas em público sem que ninguém reaja, especialmente nas grandes cidades.

      A deriva pode resultar às vezes em um trabalho duro, e se não consegues superar estes momentos de “que merda estou fazendo”, não estás mergulhando por completo no processo. Uma técnica psicológica útil para livrar-te de tua vergonha ou auto-imagem, é pôr de lado o intento da deriva por um momento e considerá-la simplesmente como um exercício abstrato de descondicionamento.

      Se te vês duvidando a respeito de alguma ação inofensiva porém extremamente peculiar, como pegar um velho sapato em plena luz do dia e pô-lo no lugar de um dos teus, ou pegar algum objeto estranhamente ressonante do centro de um lugar cheio de gente, então descobriste algo muito interessante sobre ti. Descobriste um dos muros de tua personalidade, algo que põe limites no que consideras pessoalmente como um comportamento aceitável em público. O que estou fazendo aqui? A qual propósito me serve? Observa de perto as respostas emocionais geradas e observa o que podes descobrir sobre ti mesmo. O processo de tentar mover-te para além de uma destas pequenas barreiras para adquirir um objeto de poder pode ser considerado um poderoso ato xamânico.

      Um dos aspectos mais difíceis e complexos desta forma de trabalho consiste em saber encontrar o equilíbrio adequado entre deixar-te levar e tecer o que ocorre em teu caminho até o objetivo final. Tão fácil é ser distraído por fenômenos tangenciais e olvidar por que estavas fazendo a deriva, como estar tão centrado em teu intento que acabe por ignorar algum material importante. Encontrar o equilíbrio adequado é algo que somente advém da prática e da experiência; não sejas demasiado duro contigo mesmo a princípio. Veja onde te leve a deriva, porém sempre mantenha em mente as razões pelas quais embarcaste nesta viagem. Se sentes que te estás desviando muito do caminho, não temas guiar-te com suavidade de volta. Se chega até ti algum material tangencial ou estranho que pareça não ter relação com teu objetivo, podes tomar nota para investigá-lo outro dia; pode ser que necessite de outra deriva para descobrir seus mistérios.

      Para contextualizar isto um pouco, deixo aqui uns poucos exemplos práticos sobre situações nas quais se pode usar a deriva. O método é ideal para trabalhos divinatórios, em particular se necessitas obter uma resposta rápida para alguma questão importante porém não tens acesso a parafernálias como cartas de tarot ou pedras rúnicas. Podes usar uma breve deriva divinatória em um descanso para o almoço, ou na volta para casa após o trabalho, ou em qualquer situação na qual necessites obter informação em pouco tempo através de métodos não-ordinários.

      Isto requer pouco quanto a preparação e planejamento; visita a encruzilhada, faz tuas oferendas, planteja a pergunta e vê qual resposta vem. Uma prática relacionada de obtenção de informação é a adivinhação subterrânea, que pode levar-se a cabo em qualquer cidade que tenha metrô. Inicia a deriva próximo da entrada da estação e visualiza literalmente tua descida ao metrô como uma viagem xamânica ao mundo que reside abaixo da superfície buscando conhecimentos ocultos. Estás descendo a uma paisagem extraterrestre com paredes de azulejos brancos, ásperas luzes fluorescentes e gusanos de metal que se arrastam através da terra portando humanos semiconscientes. Cavalga as linhas até que encontres a resposta que buscas. Fala com seus cidadãos, leia suas paredes, escuta suas vozes e tenta entender sua linguagem. Pode ser que queiras oferecer dinheiro a algum vagabundo subterrâneo como pagamento pela informação que receberas.

      Também podes usar a deriva se necessitas executar alguma feitiçaria espontânea e não tens acesso às ferramentas ou ao templo que usas habitualmente. Iniciarias a deriva da forma habitual podendo ser guiado para obter ingredientes para guardar em alguma bolsa de componentes ou outro objeto fetiche, que em um aperto poderia ser feito com papel ou similar atado com uma goma elástica, com uma bolsa de supermercado… caminhes pelas ruas até que encontres uma série de elementos específicos para a bolsa, os quais devem ter alguma correlação com teu intento. Os ingredientes podem ser qualquer coisa, desde plantas que te chamem atenção e cresçam entre as pedras do pavimento, a sigilos derivados de grafites nas paredes, a qualquer coisa que sintas que é adequada ou que se manifeste de alguma forma estranha. Quanto mais frequentemente trabalhares com a deriva, melhor serás em reconhecer e adquirir o que necessites.

       Depois de um tempo, pode ser que te vejas desenvolvendo alguma “linguagem” de ingredientes para utilizar em um trabalho desta natureza. Como sempre, resista à tentação de fazer alguma lista arbitrária de correspondências esteticamente agradáveis. Os ingredientes devem ter sido revelados através do processo xamânico da própria deriva. Se queres, tudo bem montar um sistema simbólico em uma tarde com uma xícara de chá e biscoitos, porém é um atalho que faz com que não estejas enredando-te por completo com a realidade xamânica. As correspondências devem ser reveladas diretamente pelos espíritos, durante a deriva. Isso é o que lhes dá poder e significado. Se evitas toda essa parte e decides que, por exemplo, as bitucas de cigarro representam o manto da alma humana, estás exterminando toda a magia do processo. A magia ocorre em territórios selvagens e imprevisíveis fora do ego individual, e não podes aproximar-te de forma alguma desses lugares se não relaxas o controle e deixas que o material emerja por si mesmo. Uma vez que tenha feito tua deriva por ingredientes e seus componentes estejam em tua bolsa, pode ser que queiras buscar um lugar apropriado para carregá-la. Se ainda não estás familiarizado com a psicogeografía de um lugar, deixa que a deriva te guie ao local adequado. Podes fazer oferendas aos espíritos associados a esse lugar em particular, ou aos Deuses ou Deusas com os quais trabalhas regularmente, e pedir-lhes que deem poder à bolsa por ti. Isto pode requerer deixá-la escondida em algum local em particular, e voltar depois de um determinado período de tempo para a recolher. Ou caminhar no sentido anti-horário ao redor de uma estátua ou um edifício sete ou nove vezes com a bolsa em tuas mãos. Ou qualquer outra coisa. Fala com os espíritos, escuta o que tenham a dizer, e não faças tratos que não estejas disposto a cumprir.

      Se planejas trabalhar regularmente com o método da deriva, deves acabar por familiarizar-te de alguma maneira com a paisagem oculta da cidade onde vives. Tenta aprender o que possas sobre a história local, observe mapas velhos da zona, invista muito tempo derivando e conheça a paisagem, o entorno e seus ecossistemas por dentro e por fora. Pode haver alguma velha encruzilhada, ou velhas rochas ou árvores, belos rios, hospitais assustadores, poços dos desejos, castelos encantados ou poderosas guaritas norturnas em tua cidade. Preste atenção no que ocorre nestes lugares. Visite-os amiúde, fale com os espíritos que os habitam e busque tornar-te seu aliado.

      Aceita a responsabilidade sobre o lugar onde vives e operas. Faça o papel de feiticeiro local em tua zona. Faça-te amigo dos poderes existentes e tente manter relações de benefício mútuo com eles. Escute o que querem de ti e mantenha sempre tua parte do trato. Sempre há sacrifícios, não se obtém nada por nada. Se provas que estás disposto a envolver-te com os problemas de tua cidade, será mais fácil que cooperem contigo. Descubra que tratos os fantasmas e espíritos de tua cidade estão preparando para fazer contigo, e quais oferendas podes proporcionar a estes.

      Não há livros de regras nem guias de passo a passo para este tipo de operação, tudo se trata de relações pessoais e interação direta. Tudo o que se pode dar são pistas e apontamentos baseados na experimentação. Este guia foi escrito principalmente a partir da perspectiva do feiticeiro urbano, porém seus princípios podem ser aplicados facilmente a um entorno rural ou a qualquer que seja o local no qual o feiticeiro viva. Se vives fora da cidade, pode ser que a informação emerja através de fenômenos como o voo de pássaros, da disposição de ramos na terra, forma das nuvens, figuras formadas por madeiras flutuando na praia e muitos outros fatores ambientais,… podes experimentar em distintas localizações, para ver o que acontece.

Publicado originalmente na Zona de Caos.

Traduzido por Lizza Bathory de La Casa de Atrás
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Necromancia e Magia, por Peter Carroll

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      A arte maldita de tentar comunicar-se com os espíritos dos mortos tem contaminado a grande obra da magia desde seu início.

      No final do século XIX e durante o XX, no Ocidente, a magia começou a separar-se da necromancia, em grande parte devido aos esforços de Macgregor Mathers e os adeptos da Golden Dawn. Aparentemente viram o espiritismo com certo e merecido descrédito e não lhes interessou incursionar na necromancia, ainda que a teoria PPM (platônica-pagão-monoteísta) subjacente em seu paradigma pudesse haver os motivado.

      Alguns dos magos cujo trabalho contribuiu para o corpus da Golden Dawn incursionaram na necromancia por um tempo, todavia com resultados não conclusivos. Dee tentou reanimar um cadáver e comunicar-se com ele em um cemitério, e Eliphas Levi tentou invocar o mago morto Apolônio de Tiana.

      A Necromancia tem persistido pelo menos desde a Idade da Pedra com a veneração dos mortos e através das práticas xamânicas de pôr-se em contato com os espíritos ancestrais, por meio de invocações mágico-pagãs com o objetivo de obter, de certas pessoas mortas, informação ou favores. A invocação católica de santos com fins similares às práticas espíritas que se desenvolveram na década de 1840 nos Estados Unidos chegou a ser frequente nas margens de muitas culturas cristãs protestantes.

      Os católicos, supostamente proíbem a necromancia, exceto quando se trata dos mitos e relíquias corporais dos Santos dos ofícios cristãos. Sabiamente quiçá, decidiram que qualquer outra forma de necromancia invoca somente "demônios" disfarçados de gente morta. Contudo o catolicismo tem o costume de rezar pelas almas dos mortos para facilitar sua passagem pelo purgatório que a dita fé lhes tem reservado; desta maneira, inclusive aparentemente os mortos não santificados não regressarão.

      A tradição medieval da Goetia (e outros grimórios) se desenvolveu dentro do catolicismo e advogou pela invocação dos mortos e demônios usando a mesma base, mais ou menos adaptável. Pelo que se crê, o necromante invoca ao melhor estilo neoplatônico a suprema unicidade ou divinidade, inclusive quando conjura demônios ou mortos para que lhe providenciem riqueza, favores, jovens mulheres, ou para vingar-se de seus inimigos. Macgregor Mathers fez, por suposto, uma tradução moderna de ambas Chaves de Salomão, porém ao que parece mais por interesse acadêmico do que para o uso da Golden Dawn. A Necromancia depende em grande parte de seu efeito sobre a gnosis do medo, a transgressão e a alta ansiedade que geram os trabalhos proibidos com demônios e cadáveres na escuridão dos cemitérios.

      À medida em que a visão cristã de vida após a morte, ainda que um tanto vaga e inespecífica, se convertia em um indesejável inferno de fogo e enxofre, também crescia o negócio sujo e explorador do espiritismo, oferecendo um intermediador que se comunicava e que, por uma tarifa, tranquilizava os vivos com a ideia de que seus mortos estavam felizes no céu. Ambas guerras mundiais geraram uma grande alta nos preços do negócio.

      A interação esotérica com os mortos parece haver tido (observando o passado) uma trajetória interessante na história humana. O corpo humano morto aparentemente evoca um certo temor e repugnância como resposta a questões evolutivas, já que esse medo da morte e da enfermidade dos cadáveres aumenta as perspectivas de sobrevivência. A dor ou culpa pela perda ou a sensação de haver ficado com alguns assuntos pendentes são um plus que fazem sua parte nessas atitudes pelos mortos. Por etapas, a humanidade tem aplacado, venerado, adorado ou tratado de controlar os mortos com infernos, céus ou purgatórios e inclusive, tentado chegar a eles para obter informações ou favores.

      No paradigma mágico Neo-Pagão não podem existir “espíritos” no sentido neoplatônico antigo. Os seres vivos e fenômenos naturais têm certas frequências de onda com as quais um mago pode chegar a interagir, porém como fenômenos “etéricos” ou manifestações “astrais” da realidade, que dependerão da existência das formas físicas; que não são anteriores no sentido platônico ou neoplatônico, e não sobrevivem à sua destruição. Todos os deuses e deusas, os fantasmas e demônios existem como amigos (e inimigos) imaginários dentro da mente humana, e entretanto, ainda assim podem causar efeitos psicológicos e parapsicológicos bastante surpreendentes.

      Assim, inadvertidamente, os católicos romanos têm se referido corretamente a "demônios" quando se evoca os mortos. Os mortos já não existem para responder, portanto, no melhor dos casos, somente se logrará uma reanimação subconsciente das recordações e expectativas dos mortos, criando uma forma de pensamento ou tulpa (como a chamam os magos tibetanos).

      Se os necromantes realmente pudessem obter informação objetiva dos mortos, então existiria uma enorme demanda dos mesmos em todas as partes do mundo para ajudar na investigação de assassinatos.

      Amigos imaginários, tulpas, deuses variados e servidores podem ser de grande utilidade e valor para o mago, desde que este não caia na armadilha de considerá-los como algo objetivamente real e aceitar sem questionar seus conselhos, porque então realmente podem converterem-se em demônios no pior sentido da palavra, amplificando os aspectos subconscientes do mago muito além de sua função original, criando obsessões.

      Portanto, agora temos todas as razões para concluir que os mortos persistem somente em nossa memória e imaginação. Parece que Eliphas Levi mais ou menos se deu conta disto e tratou de desenvolver uma teoria de magia que dependia de algum tipo de "Luz Astral" e os esforços pessoais do mago, no lugar de legiões celestiais, mortos, demônios e arcanjos. Os adeptos da Golden Dawn chegaram a conclusões similares, e inclusive Crowley desdenhava da necromancia.

      A crença na vida após a morte em muitas religiões antigas e modernas não é diferente. Realmente, ninguém que tentou descrever detalhadamente uma vida futura sem corpo logrou êxito; tentar demostrar o contrário somente busca contradizer o evidente, com fins reconfortantes (ou aterrorizantes). O atrativo da necromancia para magos modernos, que deveriam sabê-lo, se centra em todo seu carisma gótico e de obscuro glamour – o calafrio do medo. Isto pode resultar rentável para assustar os incautos, porém assustar a ti mesmo é coisa de adolescentes.

      Trabalhar com a necromancia e Goetia, persistentemente invocando a gnosis do medo, unicamente produz, a nivel pessoal, uma possível alteração do sistema nervoso autônomo, que gera o pálido, delgado e nervoso personagem característico, próprio dos altos níveis de cortisol por excesso de ansiedade. Não conduz, em troca, à auto-compreensão nem faz muito pela capacidade do mago de interagir com a realidade.

      Aqui, na Ilha do Mago [a Grã-Bretanha. N. do T.] temos liderado o mundo da magia e esoterismo durante o último século ou mais. A Teosofia, a Golden Dawn, Thelema, o moderno Hermetismo, a Wicca, o neo-paganismo, neo-druidismo e a Magia do Caos, todos se originaram aqui, de todo o que se tem feito para questionar a estupidez convencional das religiões estabelecidas e os supostos padrões do materialismo, portanto parece pouco provável que o Reino Unido também se converta no lar de um renascer da obscura arte da necromancia.

      O renascimento mágico que surgiu do romanticismo na década de 1880 e que fundou as bases para outro renascimento mágico, o da contracultura do final do século XX, atraiu inteligentes pensadores alternativos, precisamente por sua rejeição à necromancia que sempre havia aparecido na magia até então, e haveria feito com que o pensamento moderno fosse visto como um embuste.

      A necromancia, que aparece muito em papiros mágicos gregos, seria qualificada, em termos de Sir Terry Pratchett, como "Magia Draconiana” na magia Helênica (algo como a “Ciência Espacial” metafísica). Assim como a Magia Planetária se converteu na "Magia Draconiana” do Renascimento, a Magia Estelar, a tentativa de interagir com as fontes extra-terrestres da consciência e da inteligência, talvez possa converter-se na “Magia Draconiana” do futuro.

Nota da tradução espanhola por Astrid Griesser:
      Em todos momentos em que Carroll utiliza o termo necromancia, é necessário esclarecer que faz por extensão o mesmo com trabalhos com a Goetia, estariamos falando, concretamente de práticas necromânticas, posto que esta se ocupa do trato exclusivo com entidades demoníacas. Carroll, entretanto, utiliza o termo de maneira ampla, posto que para ele e dentro de seu próprio paradigma, ambos fenômenos não são outra coisa além de processos mentais. Ele esclarece este ponto quando menciona que tanto os espíritos, como os demônios, servidores mágicos ou tulpas, são processos mentais factíveis de expressão fenomenológica externa, em alguns casos.

Traduzido para o português por Lizza Bathory.

O ego por Peter Carroll

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      O ego é a personalidade. É tudo o que cremos que somos. Inversamente, é tudo o que cremos que não somos. Sentimos que é o que nos dá carácter, definição, importância, continuidade e solidez, e é o único no universo ao qual nos aferramos.

      É tudo o que parece que temos e somos. Atuamos sempre para defendê-lo e reforçá-lo. Tudo aquilo que observamos que fazemos tentamos adequar a essa imagem de nós mesmos. Sequer escolhemos essa imagem, e sim se foi acumulando-se gradualmente a partir das expectativas de nossa sociedade, de nossos mestres, parentes e amigos.

      O mais heróico dos egos é uma figura patética. Uma lamentável fachada de ilusão e autoengano coxeando uma pequena recompensa imaginária posteriormente. Omitindo e ocultando seus defeitos e seus desajeitados arranjos. As limitações reais do organismo não importam. O conflito é entre o que o ego afirma e o que nega. Em muitos aspectos o ego sofre por haver sido feito tão pequeno.

      O pior de tudo são os extensos períodos de angustioso vazio e a desesperada busca de algo ao qual possam agarrarem-se e que os preencham. Até o desfrute é uma insatisfação. O desfrutado se converte em um mero apêndice do ego. Somos escravos de nosso passado. Cada um de nossos atos está ditado pela imagem do que cremos que somos. Conforme os anos passam, se ouve este angustioso lamento: "Deuses, não há fim para este gosto amargo?"

      Alguém pode ressuscitar os mortos?

      O sábio não tem sentimentos humanos.
      O sábio não tem sentimentos inumanos.
      O sábio perdeu tudo.
Então o que lhe resta?

      Quando a falsificação do eu há sido demolida, a luz entra com a frescura da infância. Cada coisa volta a ser ela mesma, sem estar contaminada pelo eu. Livre das correntes do eu, a força vital salta novamente com uma alegre espontaneidade.

      Como se pode levar a cabo esta egotomia?

      Autoabnegação, humildade e caridade são estratagemas pouco recomendáveis. Em geral somente produzem novas presunções. Não há virtude na virtude.

      O sábio então apresenta-se como:

⇨ Indigno, porque não busca a aprovação dos outros.
⇨ Insensato, porque lhe agrada demostrar a si mesmo seus erros.
⇨ Inconstante, porque se mantém flexível e muda à vontade.
⇨ Negligente, porque não apresenta excusas para sí mesmo.
⇨ Veleidoso (pouco firme), porque muda suas crenças quando deseja.
⇨ Insubstancial, porque perdeu sua vaidade e sua importância.
⇨ Mórbido, porque sua morte lhe admoesta constantemente.
⇨ Errático, porque atua sem ânsia de resultados.
⇨ Insincero, porque somente joga a ser ele mesmo.
⇨ Insano, porque internamente ri de tudo.
⇨ Estúpido, porque lhe diverte fazer-se de tonto.

Kaos Magick Journal vol. 1, nº 2 (1998).

© Peter Carroll

Traduzido a partir de El Baile del Espíritu.

Cyber Magia, Por Christopher Penczak

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(Este livro foi escrito em 2001, época em que as formas de comunicação direta através da internet, em sua maioria, eram os chats escritos, de modo que os exemplos de rituais online descritos pelo autor deste texto, estão principalmente baseados e indicados para tal formato. Nos dias de hoje skype, hangouts, etc., permitem uma comunicação mais fluida, não centrada naquilo citado em tal artigo, portanto ao ler este interessante extrato de livro, não penses somente em quão desfasado está, e sim adapte o que o autor descreve para contexto tecnológico atual e assim poderás ver que o que ele conta é, todavia, mais pertinente atualmente do que o foi na época em que foi escrito, não obstante, a base do sistema já estava presente.)

CRIANDO O CYBER TEMPLO

      Uma das chaves na hora de criar uma comunidade é fazer coisas juntos. Os chats e grupos de debate online se adaptam à maioria dos interesses da maior parte das pessoas, porém as que estão involucradas em comunidades mágickas sabem que a celebração e a cerimônia são uma parte importante da comunidade. Se não tens uma comunidade física em teu entorno, então a comunidade online é o único lugar que tens para fazer rituais em grupo.

      Como se pode fazer isto? Se as pessoas não estão na mesma habitação, no mesmo espaço físico, elas podem realmente levar a cabo uma cerimônia? Minha experiência me diz que sim. Sou afortunado por ter uma comunidade em ambos os lados do computador. Tenho participado de maravilhosos grupos de rituais, carinhosos com amigos e familia nos bosques, na praia e no pátio da casa de meus pais. Também tenho tido o prazer de ser parte de meditações mundiais e rituais online com pessoas que entendem e compartilham aspectos sobre mim que aqueles que me rodeiam fisicamente podem não entender. São muitos diferentes e não creio que possa igualá-los de nenhuma forma, porém ambos tipos de experiências têm significado para mim. Todo o meio está saturado com possibilidades mágickas. Já que os rituais online são um formato bastante recente, não há um protocolo real para eles. O céu é o limite, porém a tecnologia tem algumas restrições práticas devido à sua simplicidade.

      A primeira coisa a decidir é se o ritual será realmente online ou simplemente sincronizado através da comunicação online. Se não for online, geralmente se faz um anúncio – incluindo a data, a hora (em vários fusos, assim aqueles que estejam em outras parte do mundo saberão quando deverão participar), e um formato básico, incluindo uma invocação grupal e a intenção do ritual. Muitas “meditações” mundiais invocam a paz durante tempos de guerra e enviam ajuda espiritual para aqueles que estão em zonas de desastres. A informação pode estar impressa e o ritual feito silenciosamente de uma forma muito introspectiva. Os grupos podem se reunir na hora escolhida, ou os individuos podem realizar o ritual separadamente. Inclusive quando trabalhares fisicamente sozinho, te darás conta de que outros ao redor do mundo fazem ecoar teus sentimentos, oxalá, em sincronização. Embora à medida que isto avance, alguns grupos possam reunirem-se online.

      Os rituais online geralmente ocorrem em salas de chat. Assim, todos sabem o que está ocorrendo a cada instante, diferentemente da forma solitária e cega de uma meditação mundial. No chat, vês as palavras cruzando a tela, invocando poderes e energias. Sabes o que cada participante está dizendo e fazendo. Podes escolher teu nivel de participação ativa, seja através do computador ou através da energia mental, emocional e mágicka.

WEB CHAT

      Os passos para organizar qualquer cerimônia são similares, não importa o lugar. Certos detalhes devem ser decididos com antecedência. O primeiro problema a ser superado em qualquer cerimônia, física ou virtual, é quem a organizará. Uma das razões que faz com que os grupos mágickos falhem é a falta de direção e organização. Esta também é uma necessidade fundamental na magia virtual. De outra maneira, as pessoas entrarão e não terão nada o que fazer. É um indivíduo ou uma organização o anfitrião desta cerimônia? Se assim o for, são responsáveis por fazer com que os implicados conheçam a data, hora e toda a informação necessária para entrar na sala de chat.

      A questão seguinte é como conseguir esta informação. A quem vais “convidar” para este ritual? É “somente para os membros” de uma lista de e-mail ou outro grupo de conhecidos? Está aberto a todos os que desejem unirem-se? Se for assim, podes postar a informação em uma lista de e-mail, ou nos grupos de notícias e anúncios, pedindo que as pessoas enviem a mensagem para aqueles que possam estar interessados. Os círculos completamente abertos podem ser difíceis se alguém desejar fazer travessuras e interromper as cerimônias vindo ao chat. Alguém que esteja em desacordo com estas crenças e sinta que todos os participantes são almas condenadas, pode, potencialmente, converter-se em um grande problema. Portanto podes querer considerar algum tipo de processo de filtragem de e-mail, como fazendo com que os interessados escrevam aos organizadores pedindo a informação necessária.

      O assunto posterior é determinar o propósito da cerimônia. É simplemente uma celebração da comunidade, ou um ato mágicko específico? Há uma meta comum, uma oportunidade para manifestar coisas em tua vida pessoal, ou uma meta mais altruísta para o mundo? Nenhuma destas opções é melhor que as outras. Somente são diferentes. Se há uma meta, esta deve ser conhecida por todos os participantes. A preparação do trabalho, tal como preparar os feitiços ou intenções, deve ocorrer antes do ritual.

      O ritual vai ser conduzido por uma pessoa ou um pequeno grupo, enquanto os demais participantes simplemente observam as ações online e prestam apoio espiritual? Todos terão uma parte no ritual, quiçá uma simples resposta às invocações? A divisão do trabalho faz com que todos sintam que estão participando, em lugar de simplesmente observando uma tela. Isto cria uma sensação de comunidade. O ritual será escrito palavra por palavra para que todos saibam o que está ocorrendo, ou os participantes terão um guia geral do ritual porém não especifico? Alguns preferem o mistério de não saber o que virá a seguir, entretanto eu prefiro estar completamente preparado. Se vais participar de rituais online, por favor aprenda a teclar rápido e apropriadamente. Nada é mais frustrante que esperar que alguém tecle a invocação seguinte do ritual. Os atrasos como este podem desacelerar o impulso do ritual e esfumaçar a consciência de grupo. Em muitos sentidos, aprender a teclar é o primeiro requerimento da “netiqueta” para rituais online. Se o ritual estiver completamente escrito, podes simplesmente cortar e pegar o texto antes de enviá-lo ao chat. Desta forma o ato de teclar já não será um problema. Alguns rituais têm forma livre, permitindo a todos os participantes escolher quaisquer palavras e intenções que desejem. Tais rituais são maravilhosos em pequenos e íntimos grupos, todavia em grupos maiores podem tornarem-se um pouco confusos.

      Na primeira vez que te vejas implicado em um grupo online, particularmente se o grupo já funcionava antes de te unires a ele, provavelmente seria melhor, tomares um papel mais passivo na cerimônia para aprender como funcionam as coisas.

      Uma vez que tenhas a informação técnica – como, onde, quando, o formato do ritual, e quem é responsável pelo que – os aspectos mais mágickos da cerimônia podem ser contemplados. Para muitos, a experiência de um ritual online consiste em simplesmente sentar-se em frente a uma tela e ver as mensagens aparecerem. Se tua própria experiência começar desta forma, não te desanimes. De certa forma, para ter uma experiência online muito mágicka, deves ser mais habilidoso na visualização e no trabalho com a energia que para rituais físicos. O verdadeiro coração da experiência é a multitarefa, é ser capaz de fazer mais de uma coisa por vez.

      A maioria de nós visualiza e “vê” com os olhos fechados, usualmente em uma habitação escura. Algumas vezes, se acende uma vela e incenso. Estas são grandes ferramentas para estabelecer o ambiente na magia física e online. Use-as se já o fazes. A ideia de teclar durante um ritual, e observar uma tela ao mesmo tempo, parece distrair a maioria. Como posso fechar meus olhos e “estar assim”? Se és uma pessoa que consegue realizar multitarefas, a resposta é simples. Embora estejas com teus olhos abertos, estás consciente, no olho de tua mente, de estar em outro lugar. Consciente de que parte de tua energia é projetada através do cosmos, ou através da Internet, para unir-se com teus companheiros na cerimônia. A experiência visual pode não ser tão forte como em um transe profundo com os olhos fechados, porém a sensação de estar com outras pessoas em um espaço sagrado é mais importante que qualquer outra coisa.

      Se alguém estiver fazendo a maior parte dos deveres ritualísticos, as palavras reais da cerimônia podem incluir imaginação guiada, como em uma meditação guiada, para que todos os participantes possam focarem-se em uma imagem particular com a qual se conectarão, para alcançar um pensamento coletivo através deste círculo virtual. É útil que os membros visualizem uma rede, uma rede de luz que os conecta. Se estiveres fazendo uma variação do círculo mágicko, os membros podem visualizar o círculo avançando de membro a membro. Se puderes crie uma lista que determine quem está “de pé” ao lado de quem neste círculo virtual. A ordem pode estar baseada alfabeticamente, na ordem de entrada no chat, ou inclusive na localização geográfica, se as pessoas desejarem compartilhar tal informação.

      A imaginação guiada também pode incluir a criação de um templo virtual. Igualmente com a meditação guiada se pode criar um templo astral, uma base de operações por assim dizer, na qual o grupo possa meditar, fazer trabalhos oníricos e conectar-se durante o ritual. Os tecnomantes podem criar templos no espaço virtual, através da imaginação coletiva. Cada membro do grupo deve agregar pensamentos e poder à imagem coletiva. Este pode ser descartado e desmantelado depois da cerimônia, para ser construído de novo, ou mantido para futuros trabalhos. Em muitos sentidos, é justamente como os mais tradicionais espaços compartilhados que existem no plano astral, porém crescendo a partir de sementes plantadas na Internet. Uma vez criados, estes espaços são acessíveis para todos os membros, tanto quando eles estão online fazendo rituais, como quando nos estados mais meditativos ou oníricos.

      O último obstáculo a ser superado é a mecânica da operação mágicka. Se tua intenção não é uma simples celebração da comunidade, e sim um trabalho mágicko com uma meta em mente, necessitarás de um veículo para que o grupo foque e eleve a energia enviando-a à intenção. Esta não é uma tarefa fácil para uma comunidade online. Primeiro, como determinar a mentalização do feitiço? Há um feitiço individual, ou todos querer fazer o seu próprio? Se for individual, todos podem escrever sua intenção (antes do ritual) em um formato similar. Quando chegar o momento de fazer o trabalho, cada pessoa pode enviar a intenção ao chat para que todos a vejam. Então todos focam-se nela e visualizam a meta. A ordem pode ser determinada antes da operação mágicka. Se estás usando o círculo imaginário, simplemente recorra ao círculo. Alguns praticantes estão acostumados a liberar uma intenção nos rituais tradicionais enterrando a intenção ou queimando-a, assim pode ser que necessites de uma ação para liberar o feitiço. Uma forma inovadora para este problema virtual é enviar um e-mail a uma “direção falsa”, uma especialmente disposta para receber tais feitiços ao fim do ritual, através da qual lançarão-nos até o cosmos, lançando literalmente à Internet. Você pode criar um endereço de e-mail para receber estas intenções.

      Para feitiços em grupo, ter um símbolo comum sobre o qual possam focar é muito efetivo. Use técnicas de criação de sigilos para encontrar ou criar um símbolo apropriado. Podes usar programas gráficos para criar o símbolo como um arquivo informático. Desta forma, podes trabalhar em tuas habilidades mágickas assim como, com teu computador, em tua capacidade de desenhar. O símbolo pode ser facilmente compartilhado em uma página Web, fazendo com que todos os membros a visitem antes do ritual e guardem ou imprimam o gráfico. O símbolo também pode ser compartilhado por e-mail em um formato de arquivo comum, geralmente JPEG ou GIF. A maior parte dos navegadores podem ler estes tipos de arquivo sem nenhum problema. Os programas gráficos usualmente te oferecem uma opção GUARDAR COMO, na qual podes escolher um formato apropriado.

      No lugar de teclar tua intenção durante o ritual, simplemente podes enviar o sigilo ao grupo antes do ritual e dizer-lhes que se concentrem no símbolo no momento apropriado durante a cerimônia. Alguns sentem energicamente que todos deveriam conhecer a intenção por detrás do símbolo, pois isso tornaria a magia mais poderosa, enquanto que outros realmente sentem que o desapego pelo resultado é mais efetivo. Sinceramente, ainda que considere o desapego uma ferramenta muito efetiva, tenho dificuldades para participar em uma meta mágicka da qual não estou completamente consciente, a menos que confíe implicitamente no criador. Siga tuas próprias preferências e intuição em tais assuntos.

RITUAL ONLINE

      Este é um exemplo de um ritual online. Use-o como um guia, esboço ou inspiração. Até para os mais experimentados praticantes de magia tradicional, a ideia de rituais online pode parecer espantosa. O que é uma segunda natureza no mundo físico se converte em algo embaraçoso no mundo cibernético. Este exercício foi escrito como um guia, com palavras que podem ser tecladas e compartilhadas em um chat. O ritual pode transcorrer exatamente como está escrito, ou pode ser compartilhado para permitir o contato, criatividade e espontaneidade pessoal. As imagens podem ser uma parte específica do ritual, ou enviadas a todos os membros anteriormente, assumindo que todos visualizaram estas coisas sem necessidade de reenviá-las no chat.

      Para simplificar, os papéis estão divididos em Líder e participantes. O papel do Líder pode, por sua vez, ser subdividido entre um pequeno grupo. Este ritual está baseado no círculo mágicko.

      Líder: Todos se unam momentos para acalmarem-se e concentrarem-se. Acendam algumas velas ou incenso. Organizem e coloquem próximo quaisquer ferramentas ritualísticas ou cristais que achem necessário. Tomem umas poucas respirações profundas e foquem vossa atenção para a tarefa.

      Líder: Criamos este círculo através da Web para nos proteger de todas as forças que venham a ser prejudiciais ao nosso propósito. Pedimos que somente aquelas energias que venham com perfeito amor e perfeita confiança, em completa harmonia com nossas intenções mágickas, entrem neste círculo. Criamos um templo sagrado além do tempo e do espaço, entre os mundos, onde nossas intenções mágickas se manifestarão. Assim seja.

      Participantes: Assim seja.

      Líder: Visualizem o círculo de luz deslocando-se através da Web que nos conecta. Sintam-se conectados por este anel de luz, que se estende ao redor do mundo envolvendo todos os membros, estendendo-se através do mundo.

      Líder: Ao norte, peço ao elemento da terra e aos guardiões das atalaias do norte que estejam conosco, para guardar, guiar e serem testemunhas desta magia. Saudações, sejam bem-vindos.

      Participantes: Saudações, sejam bem-vindos.

      Líder: Ao leste, peço ao elemento do ar e aos guardiões das atalaias do leste que estejam conosco, para guardar, guiar e serem testemunhas desta magia. Saudações, sejam bem-vindos.

      Participantes: Saudações, sejam bem-vindos.

      Líder: Ao sul, peço ao elemento do fogo e aos guardiões das atalaias do sul que estejam conosco, para guardar, guiar e serem testemunhas desta magia. Saudações, sejam bem-vindos.

      Participantes: Saudações, sejam bem-vindos.

      Líder: Ao oeste, peço ao elemento da água e aos guardiões das atalaias do oeste que estejam conosco, para guardar, guiar e serem testemunhas desta magia. Saudações, sejam bem-vindos.

      Participantes: Saudações, sejam bem-vindos.

      Líder: Convidamos a todos os espíritos que venham de uma maneira correta para nossas intenções. Convidamos a nossos Deuses, guias e guardiões pessoais.

      Participantes: (Todos podem individualmente dar boas vindas a seus patronos pessoais teclando o nome de suas deidades ou espíritos.)

      Líder: Neste espaço, criamos um templo. Nosso trabalho hoje é a magia da prosperidade e o templo está repleto com as cores verde, azul e púrpura, para atrair abundância a nossas vidas. O templo está repleto com o mais fino dos luxos, acessórios de ouro e prata, finas sedas e todas as modernas conveniências que podemos desejar. Tudo o que desejamos está neste templo.

      Líder: Enquanto fazemos nosso trabalho mágicko, cada membro, em ordem, enviará ao grupo sua intenção de prosperidade e manifestação. Como grupo, todos enviaremos nossa energia durante uns breves momentos, visualizando o resultado enquanto trabalhamos juntos neste templo.

      Participantes: (Cada pessoa, em ordem, envíará sua intenção ao chat.)

      Líder: Liberamos todas estas intenções para manifestar nosso bem superior, sem prejudicar ninguém no processo. Assim seja.

      Participantes: Assim seja.

      Líder: Nós tomaremos uns breves momentos para concentrar-nos.

      Líder: Damos graças e libertamos todos os seres que estiveram conosco, por ajudar-nos em nosso trabalho.

      Líder: Ao norte, dou graças e libero o elemento da terra e os guardiões das atalaias do norte. Saudações e adeus.

      Participantes: Saudações e adeus.

      Líder: Ao oeste, dou graças e libero o elemento da água e os guardiões das atalaias do oeste Saudações e adeus.

      Participantes: Saudações e adeus.

      Líder: Ao sul, dou graças e libero o elemento do fogo e os guardiões das atalaias do sul. Saudações e adeus.

      Participantes: Saudações e adeus.

      Líder: Ao leste, dou graças e libero o elemento do ar e os guardiões das atalaias do leste. Saudações e adeus.

      Participantes: Saudações e Adeus.

      Líder: Libertamos este círculo através da rede da vida para manifestar nossas intenções. Assim seja.

      Participantes: Assim seja.

O FUTURO DA CYBER MAGIA

      Ninguém pode saber realmente até onde estamos conduzindo tais técnicas ao mundo mágicko. Podem ser simples experimentos abandonados posteriormente em favor de técnicas tradicionais, como parte de um mundo que reaciona contra os avanços tecnológicos. Por outro lado, a cyber magia pode ser o início de toda uma nova revolução mágicka, fazendo-se conhecer coletivamente muitas de suas ideias e técnicas. É simplesmente demasiado cedo para julgarmos.

      Com o avanço da tecnologia da realidade virtual, na qual a mente humana se funde com o mundo informático através de sinais visuais e sensoriais, a ideia de rituais online pode torna-se algo muito mais próximo ao tradicional círculo físico. No espaço virtual, serás capaz de “ver” representações geradas por computador de teus companheiros de pé a teu lado. Quando desenhares um pentagrama de banimento no ar do cyber espaço todos o verão, brilhando em chamas geradas pelo computador. Para aqueles com dificuldades de visualização, isto parece uma façanha surpreendente. Os detratores podem sentir que esta é a mesma razão pela qual tal tecnologia não deveria ser usada. Faz com que nossos “músculos mágickos”, nossa visão interior, se atrofie e deixa com que o computador faça o trabalho por nós.

      Qual a visão correta? Somente o tempo dirá. Pessoalmente, estou dividido entre ver o melhor que ambos os mundos podem oferecer, e o pior. Obviamente, não sinto que a tecnologia seja inerentemente má ou não a usaria. Todas as máquinas, inclusive os computadores, são ferramentas a serem usadas com sabedoria. Nossas modernas ferramentas do século XXI são tão diferentes daquelas dos séculos passados que é difícil seguir a trilha de seus possíveis abusos.

      Outro ponto interessante a ponderar é sobre o meio que estamos usando. Irá a Internet mais além da definição tradicional de uma ferramenta ritualística e crescerá até algo mais? Como trabalhadores mágickos, bruxas e pagãos, personificamos tudo na vida. Tudo está vivo, desde os óbvios espíritos dos animais e árvores, até rochas, nuvens e água. Muitas destas forças naturais são assistidas por deidades, formas divinas culturais responsáveis pelas interações da humanidade com os elementos. Alguns magos veem os Deuses e espíritos como ferramentas, um meio para comunicarem-se com o vasto universo desconhecido. Na exploração da magia da cidade, a cidade em si é personificada como um vórtice vivente de energia, de força vital. Os seres e estruturas que ocupam este espaço também exibem traços de personalidade, de individualidade e de unicidade. Poderia a Internet não exibir esses mesmos traços? Esta nova entidade simplesmente é a encarnação do conhecimento, dos dados brutos de todas as partes e de tudo. Imagine invocar a tal ser. As possibilidades são assombrosas. Conforme a investigação das inteligências informáticas prossiga, o potencial irá além de simples arquétipo, adentrando no reino da possibilidade literal.

      Nossa ficção científica aponta a possíveis mesclas mágickas e tecnológicas, onde ambas as artes são honradas e combinadas. Se a ficção científica é simplesmente um mapa até nossos possíveis futuros, então tal realidade pode existir. Recorde, não obstante, que a ficção científica previu um país controlado pelo “Grande Irmão” em 1984, uma base lunar a toda velocidade pelo espaço repleta de fantásticos alienígenas em 1999. Muito melhor prestar atenção à realidade aqui e agora, e escolher conscientemente o que poderá ser nosso futuro. Não é esse o coração da magia – a criação de teu próprio destino?

(Traduzido para o espanhol por Manon de City Magic e, a partir deste, traduzido para o português por Lizza Bathory)