
Os casos de transmissão de pensamento aparente, de ante-visão de acontecimentos futuros, em sonhos e o conhecimento do que está acontecendo a amigos ou parentes ausentes, sem o uso de meios normais de comunicação, têm sido narrados tanto nos tempos antigos como no moderno, entre povos primitivos e civilizados. A literatura clássica e hebraica contém muitos relatos dessa natureza. José, sonhando às margens do Nilo, previu o advento dos rever anos de fartura e dos sete anos de carestia. Santo Agostinho relata que um de seus discípulos pediu ao adivinho cartaginense Albicério que dissesse em que ele, discípulo, estava pensando. Albicério respondeu corretamente que o discípulo estava pensando numa frase de Virgílio e, em verdade, recitou-a embora fosse um homem de pouca instrução. Se essa história for verdadeira, Albicério estava um passo à frente de nossos adeptos modernos que são capazes de dizer-nos unicamente qual de cinco símbolos o experimentados está olhando.
Há ainda o caso de Sosipatra, lente universitária, que interrompeu uma palestra de filosofia que estava fazendo para descrever, com detalhes, um acidente que, nessa ocasião, acontecia a seu conterrâneo Filometor quando passeata em sua carruagem muitas milhas distante. Ela viu a carruagem tombar, as pernas do passageiro em perigo de serem esmagadas, quando era retirado de dentro, a salvo, pelos criados, apenas com alguns ferimentos nos cotovelos e nas mãos. A descrição parece ter coincidido com os fatos reais, tendo Sosipatra ganho a reputação de ser dotada de presciência.
Se é impossível verificar a exatidão dessas histórias antigas, está longe de ser fácil descobrir a verdade no que se refere aos inúmeros casos modernos de que elas são os protótipos. Recentemente um jornal de Londres (CF THE STAR, em várias datas, em julho e julho de 1951) convidou os leitores a enviarem suas histórias com referência ao "sexto sentido, oferecendo o prêmio de um guinéu para cada história publicada. Cartas contendo relatos de experiências estranhas ou de sonhos proféticos apareceram dia após dia durante várias semanas. Muitos desses relatos eram, por si próprios, de extraordinário interesse, e a coleção completa de várias centenas deles deveria sugerir que as experiências psíquica são relativamente comuns em nosso século XX. No entanto, imaginamos qual a proporção dessas histórias seria invenção pura e em quantos casos uma experiência real do narrador foi exagerada ou adulterada, talvez além do admissível. Tais casos naturalmente constituem pouco mais do que material de prima facie a ser investigado por um competente pesquisador psíquico. Pondo de parte a possibilidade de intenção deliberada ou brincadeira, existem as falsificações mais sutis que surgem das distorções da memória a que todos nós estamos sujeitos em maior ou menor grau.
Por exemplo, um homem sonha que vê um gato sendo atropelado por um automóvel. No dia seguinte presencia o atropelamento de um gato malhado por carro azul. Provavelmente não tomou nota, por escrito, do sonho logo ao acordar, mas contou-o à esposa durante o café. Quando vê o acidente real, está pronto a acreditar que o gato do sonho era malhado e que o carro do sonho era azul. Mais estranho ainda, quando relata o acidente à esposa ao voltar para casa, ela poderá acreditar que ele falou em um gato malhado e em um carro azul ao contar o sonho na hora do café. A moral naturalmente está no fato de que, quando se tem um sonho muito vívido que parece ter relacao com o futuro, deveríamos anotar os detalhes precisamente como são lembrados imediatamente depois de acordarmos e enviar as anotações para a Sociedade de Pesquisas Psíquicas.
Algumas profecias de desastres, feitas em sonho ou dadas através de médiuns, podem tornar-se realidade por não deixarem em paz o espírito da vítima. Em tais casos, uma explicação paranormal é frequentemente supérflua. George Barrow, em seu livro THE BIBLE IN SPAIN (A Biblia na Espanha), relata como numa mania da viagem de ida um marinheiro contou-lhe um sonho que tivera durante a noite. O marinheiro vira a si mesmo caindo do mastro. Um pouco mais tarde, naquele dia, ordenaram-lhe que subisse no mastro, foi atingido por uma vela solta na tempestade e atirado ao mar; desapareceu antes que um bote pudesse alcançá-lo.
O hábito de Barrow de dar certo colorido a suas narrativas é bem conhecido, mas mesmo que admitamos a veracidade neste caso, não é certo se o pobre marinheiro poderia ter escapado ao desastre se sua mente não estivesse perturbada pela apreensão e preocupação induzidas pelo sonho.
Mas se considerarmos unicamente os casos em que o relato é rigorosamente exato, ainda permanece a dúvida se a extensão que as ligações observadas entre o sonho e sua realização e se os depoimentos do observador e os acontecimentos reais, a que esses depoimentos parecem referirem-se, não poderiam ser resultado de cega e vazia justaposição de circunstâncias a que chamamos chance. Num mundo em que miríades de acontecimentos, desde os mais simples aos mais complexos, são infinitamente embaralhados, não seria de esperar, em certas ocasiões, que surgissem circunstâncias que mostrassem enganosa aparência de estarem carvalodoue relacionadas. É certo que na vida comum encontramos coincidências curiosas que nossa razão indica só poderem ser o resultado de acidente. O sobrenome de um dos autores deste livro é incomum; quando ele alugou um apartamento perto de Wandsworth Common, não conhecia os nomes dos outros moradores. Julguem então seu assombro quando descobriu que os vizinhos do andar de baixo tinham o mesmo nome embora soletrado de maneira um pouco diferente. Ao consultar as listas telefônicas e as estatísticas de casas e apartamentos de Londres podemos, sem muitas dificuldades, fazer uma estimativa aproximada da probabilidade de existir uma moradia que contivesse duas pessoas não aparentadas com os nomes de Soal, Soul ou Sole.
Se tentássemos empregar a estatística num caso como o de Sosipatra, estaríamos nos defrontando com uma tarefa impossível, pois precisaríamos de dados numéricos impossíveis de obter mesmo que tivéssemos sido seus contemporâneos. Deveríamos obrigatoriamente indagar quantas pessoas havia na Grécia, que, como Sosipatra, estavam adivinhando as andanças de parentes distantes e quantas vezes essas pessoas se enganavam. Poderíamos sem dúvida, fazer uma estimativa da porcentagem dos acidentes dos passageiros de carruagens, mas se chegássemos à conclusão de que o cocheiro de Filometor era um indivíduo descuidado, que deixava a carruagem virar em média uma vez cada quinze dias, nossas estimativas cuidadosamente compiladas não teriam valor, e nossas probabilidades precisariam ser revistas.