DRAGÃO por Profecias

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O dragão nos aparece essencialmente co­mo um guardião severo ou como um sím­bolo do mal e das tendências demoníacas. Ele é, na verdade, o guardião dos tesouros ocultos, e, como tal, o adversário que deve ser eliminado para se ter acesso a eles. No Ocidente, o dragão guarda o Tosão de Ouro e o Jardim das Hespérides; na China, num conto da dinastia T'ang, guarda a Pérola. A lenda de Siegfried confirma que o tesouro guardado pelo dragão é a imor­talidade.Como símbolo demoníaco, o dragão se identifica, na realidade, com a serpente*: Orígenes confirma essa identidade a propó­sito do salmo 74. As cabeças de dragões quebradas, as serpentes destruí­das, são a vitória do Cristo sobre o mal. Afora as imagens bem conhecidas de São Miguel e de São Jorge, o próprio Cristo é representado ocasionalmente calcando aos pés um dragão. O patriarca zen Huei-neng faz igualmente dos dragões e das ser­pentes os símbolos do ódio e do mal. O terrível Fudô (Acala) nipônico, dominando o dragão, vence, assim, a ignorância e a obscuridade.Mas esses aspectos negativos não são os únicos nem os mais importantes. O simbo­lismo do dragão é ambivalente, o que, aliás, é expresso, na imaginária do Extremo Oriente, pela figura dos dois dragões que se afrontam, motivo que volta na Idade Média e, mais particularmente, no hermetismo europeu e muçulmano, onde essa confrontação assume aspecto análogo ao das serpentes no caduceu. É a neutralização das tendências adversas, do enxofre e do mer­cúrio alquímicos (ao passo que a natureza latente, não desenvolvida, é representada pelo uróboro*, a serpente ou dragão em­blemático mordendo a cauda). No próprio Extremo Oriente, o dragão comporta aspec­tos diversos, o que não é de admirar num animal aquático, terrestre — i.e., subterrâ­neo — e celeste, tudo ao mesmo tempo. Nis­so ele se assemelha à Quetzalcoatl ou ser­pente de plumas, dos astecas. Já se tentou, mas sem nenhum sucesso, distinguir entre o dragão long (aquático) e o dragão ku'ei (terrestre). Existe no Japão uma distinção popular entre as quatro espécies: celeste, pluvial, terrestre-aquático, e subterrâneo.Na realidade, trata-se apenas de aspectos distintos de um símbolo único, que é o do princípio ativo e demiúrgico: poder divino, élan espiritual, diz Grousset. Símbolo celes­te, em todo caso, poder de vida e de mani­festação, ele cospe as águas primordiais ou o Ovo do mundo, o que faz do dragão uma imagem do Verbo criador. Ele é a nuvem que se desenrola por cima das nos­sas cabeças e derrama a sua abundância de águas fertilizantes. É o princípio k'ien, origem do Céu e produtor da chuva, cujos seis cavalos de tiro são seis dragões atrela­dos; seu sangue, diz ainda o I-ching, é negro e amarelo, cores primordiais do Céu e da Terra. Os seis traços do hexagrama k'ien representam, tradicionalmente, as seis etapas de manifestação, desde o dragão escondido, potencial, não-manifestado, não-ativo, até o dragão planador, que volta ao princípio, passando pelo dragão nos cam­pos, visível, saltador e voador.O dragão se identifica, segundo a doutri­na hindu, ao Princípio, a Agni ou a Prajapâti. O Matador do Dragão é o sacrifica­dor, que aplaca a potência divina e com ela se identifica. O dragão produz o soma, que é a bebida da imortalidade; ele é o soma da oblação sacrificial. O poder do dragão, ensina Chuang-tse (Zhuangzi), é coi­sa misteriosa: é a resolução dos contrários; por isso Confúcio viu, segundo ele, em Lao-tse a própria personificação do dragão. Por outro lado, se o dragão-soma propor­ciona a imortalidade, o dragão chinês igual­mente conduz a ela. Os dragões voadores são montarias de Imortais; eles os elevam até o Céu. Huangti, que havia utilizado o dragão para vencer as más tendências, su­biu ao Céu no dorso de um dragão. Mas ele era, ele mesmo, dragão, bem como Fu-hi, o soberano primordial, que recebeu de um cavalo-dragão o Ho-t’u. E foi graças ao dragão que Yu o Grande pôde organi­zar o mundo, drenando as águas exceden­tes: o dragão, enviado do Céu, abriu-lhe o caminho (k'ai tao).Potência celeste, criadora, ordenadora, o dragão é, muito naturalmente, o símbolo do imperador. É extraordinário que tal simbolismo se aplique, não só na China, mas entre os celtas, e que um texto hebraico fale do dragão celeste como de um rei no seu trono. Ele é, de fato, associado ao raio (cospe fogo) e à fertilidade (traz a chuva). Simboliza, assim, as funções régias e os ritmos da vida, que garantem a ordem e a prosperidade. É por isso que se tornou o emblema do imperador. Da mesma forma que se expõem os retratos deste quando o país é assolado pela seca, faz-se uma ima­gem do dragão Yin, e começa logo a cho­ver.O dragão é uma manifestação da onipotência imperial chinesa: a face do dragão significa a face do imperador; o andar do dragão é o porte majestoso do chefe; a pérola do dragão, que ele carrega, ao que se acredita, na garganta, é o brilho indis­cutível da palavra do chefe, a perfeição do seu pensamento e de suas ordens. Não se discute a pérola do dragão, declarava ainda em nossos dias, Mao.Se o simbolismo aquático permanece, evi­dentemente, capital; se os dragões vivem na água, fazem brotar as fontes; se o Rei-dragão é um rei dos nagas, identificando-se, aqui também, à serpente — o dragão está ligado sobretudo à produção da chuva e da tempestade, manifestações da atividade celeste. Unindo a terra e a água, ele é o símbolo da chuva celeste fecundando a terra. As danças do dragão, a exposição de dragões de cor apropriada, permitem obter a chuva, bênção do céu. Em conseqüência, o dragão é sinal de bom augúrio, sua aparição é a consagração dos reinados felizes. Pode acontecer que da sua goela saiam folhagens: símbolo de germinação. Segundo um costume indonésio, no dia de ano-bom, rapazes se revestem de um dra­gão de papel, que animam e fazer dançar serpenteando pelas ruas, enquanto que os cidadãos, debruçados às janelas, lhes ofe­recem saladas verdes, que o dragão engole para grande júbilo do público. A colônia indonésia dos Países Baixos perpetua, todo ano, esse rito, pelas ruas de Amsterdam. O trovão é inseparável da chuva: seu relacionamento com o dragão se prende à noção de princípio ativo, demiúrgico. Huang­ti, que era dragão, era também o gênio do trovão. No Kampuchea (Camboja), o dragão aquático possui uma gema cujo brilho — e relâmpago — produz a chuva.A escalada do trovão, que é a do yang, da vida, da vegetação, da renovação cícli­ca, é representada pela aparição do dragão, que corresponde à primavera, ao nascente, à cor verde: o dragão se eleva no céu no equinócio da primavera e mergulha no abismo do equinócio do outono, o que é traduzido pela posição das estrelas kio e ta-kio. Espiga da constelação da Virgem, e Arcturo — os cornos do dragão. A utiliza­ção do dragão na ornamentação das portas no Oriente lhe confere também um simbolismo cíclico, mas principalmente de natu­reza solsticial. Astronomicamente, a cabeça e a cauda do dragão são os nós da Lua, os pontos onde se dão os eclipses. Donde o simbolismo chinês do dragão devorando a lua ou o simbolismo árabe da cauda do dragão como região tenebrosa. Voltamos, aqui, a um aspecto obscuro do simbolismo do dragão, mas a ambivalência é constante: o dragão é yang enquanto signo do trovão e da primavera, da atividade celeste; e é yin enquanto soberano das regiões aquáticas; yang naquilo em que se identifica com o cavalo, com o leão — animais solares —, com as espadas; yin quando metamorfoseado em peixe ou identificado com a serpente; yang como princípio geomântico, yin como princípio alquímico (mercúrio). O dragão vermelho é o emblema do País de Gales. O Mabinogi de Lludd e Llewelys conta a luta do dragão vermelho e do dragão branco, este último simbolizando os saxões invasores. Finalmente, os dois dragões, bêbados de hidromel, são enterrados no centro da ilha de Bretanha, em Oxford, num cofre de pedra. A ilha não deveria sofrer outra invasão enquanto eles não fossem descobertos. O dragão trancafiado é o símbolo das forças ocultas e contidas, as duas faces de um ser velado. O dragão branco usa as cores lívidas da morte, o dragão vermelho as da cólera e da violência. Os dois dragões enterrados juntos significam a fusão do seu destino. A cólera amainou, mas os dragões poderiam ressurgir juntos. Permanecem como ameaça, como poder virtual, prontos a lançar-se contra qualquer novo invasor.
É lícito ligar a imagem da baleia que vomita Jonas à simbólica do dragão, monstro que engole e cospe a sua presa, depois de a ter transfigurado. Essa imagem de origem mítica solar representa o herói no ventre do dragão. Morto o monstro, o herói reconquista uma eterna juventude. Comtemplada a descida aos infernos, ele ascende do país dos mortos e da prisão noturna do mar. A análise de C.G. Jung tirou partido desse mito, no qual a experiência clínica reconheceu a substância de muitos sonhos e da sua interpretação tradicional: o mito familiar de Jonas e da baleia, em que o herói é engolido por um monstro marinho que o arrasta para o mar alto, à noite, de oeste para leste, simboliza a marcha suposta do sol, do crepúsculo da tarde até a alvorada.O herói, explica J. L. Henderson, afunda-se nas trevas, que representam uma espécie de morte... A luta entre o herói e o dragão... deixa transparecer ... o tema arquetípico do triunfo do Ego sobre as tendências regressivas. Na maioria das pessoas, o lado tenebroso, negativo, da personalidade permanece inconsciente. O herói, ao contrário, deve dar-se conta de que a sombra existe e que ele pode tirar forças dela. Tem de compor-se com as potências destrutivas se quiser tornar-se suficientemente forte para medir-se com o dragão e vencê-lo. Em outras palavras, o Ego só pode triunfar depois de ter dominado e assimilado a sombra. O mesmo autor cita, no mesmo sentido, a aceitação por Fausto do desafio do Mefistófeles, o desafio da vida, o desafio do inconsciente: através dele, através daquilo que ele acreditou fosse a perseguição do mal, ele desemboca nos horizontes da salvação.
Todos os dragões de nossa vida são, talvez, princesas encantadas, que esperam ver-nos belos e bravos. Todas as coisas terrifican­tes podem ser, apenas, coisas inermes que esperam socorro de nós. O dragão está pri­meiro em nós.
Os dragões representam, também, as le­giões de Lúcifer em oposição aos exércitos dos anjos de Deus: Deslocando-se um pouco mais depressa que a luz divina, cuspindo antes do tempo todos os fogos do inferno, poderosamente armados com todas as gar­ras do ódio e com todos os croques do de­sejo, couraçados de egoísmo, munidos das asas possantes da mentira e da astúcia, os dragões de Lúcifer estavam para o mal como os anjos de Deus estavam para o bem. Os dragões de Lúcifer!... Silvando, soprando, uivando, rugindo, eles se preci­pitam ainda sobre nós do fundo das idades e das trevas... As serpentes, os ratos, os morcegos, os vampiros, tudo o que tem um toque de horror e de poder maléfico na me­mória ancestral e na imaginação popular é, mal camuflada, uma imagem de dragões que ameaçavam o Todo-Poderoso. Se algu­ma coisa subsiste, no fundo do inconscien­te coletivo, do terror original e da repug­nância primeva, é certamente a sombra da besta fabulosa e abjeta que compunha o grosso daquilo a que chamaríamos hoje, para falar a nossa linguagem, e forçando os termos com uma vulgaridade um tanto fácil, as forças aéreas e os contingentes blindados do Tinhoso.
São Jorge ou São Miguel em combate com o dragão, representados por tantos artistas, ilustram a luta perpétua do bem contra o mal. Sob as formas as mais varia­das, o tema obsessiona todas as culturas e todas as religiões e aparece até no mate­rialismo dialético da luta de classes.
O eixo dos dragões, no tema astrológico, é também chamado eixo do destino. A ca­beça do dragão, que indica o lugar onde se deve construir a sede da existência cons­ciente, opõe-se à cauda do dragão, que revolve todas as influências vindas do pas­sado, o carma de que é preciso triunfar. Essas duas partes do dragão são igualmen­te chamadas nós lunares, norte e sul. Trata-se de pontos nos quais a trajetória da Lua cruza com a do Sol.
O dragão é o símbolo do mercúrio filo­sofal. Dois dragões que se dão combate designam as duas matérias da Grande Obra, i.e., da busca da pedra filosofal: um deles é alado; o outro, não, para signifi­car justamente a fixidez de um e a volatilidade do outro. Quando o enxofre, fixo, transmudou, em sua própria natureza, o mercúrio, os dois dragões são substituídos como sentinelas à porta do jardim das Hespérides, e é possível colher sem medo os pomos de ouro.
A linhagem Brug-pa Kagyu-pa, que per­tence ao Veículo de Diamante, significa linhagem do dragão Kagyu-pa. Seus ensi­namentos estão magnificamente expostos na Vida e cantos de Brug-pa Kung-Legs, o Yogin, que viveu no séc. XV, e cujo nome significa Belo Dragão. É venerado no Butã (País do Dragão), vizinho do Ti­bete.

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LORD KRONUS
LORD KRONUS
Admirador do Oculto e cinéfilo. azerate666@hotmail.com Confira mais textos deste autor clicando aqui

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