SONHOS LÚCIDOS

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Um sonho lúcido é qualquer sonho em que se está ciente de que se está sonhando. O termo foi cunhado pelo psiquiatra e escritor holandês Frederik (Willem) van Eeden (1860-1932). Em um sonho lúcido, o sonhador pode exercer algum grau de controle sobre a sua participação dentro do sonho ou ser capaz de manipular suas experiências imaginárias no ambiente de sonho.

Os sonhos lúcidos pode ser realistas e vívidos. É mostrado que há uma maior faixa de frequência de beta-1 (13-19 Hz) vivida por sonhadores lúcidos, portanto, há uma aumento da quantidade de atividade nos lobos parietais fazendo sonhos lúcidos um processo consciente. O sonho lúcido foi pesquisado cientificamente, e sua existência está bem estabelecida.

História científica

O primeiro livro a reconhecer o potencial científico dos sonhos lúcidos foi de Celia Green, de 1968, Estudo sobre os Sonhos Lúcidos. Green analisou as principais características de tais sonhos, revendo os escritos publicados anteriormente sobre o assunto e incorporando novos dados a partir de temas de sua própria pesquisa. Ela concluiu que os sonhos lúcidos eram uma categoria de experiência bastante distinta dos sonhos comuns, e previu que viria a ser associado com o sono REM. Green foi também o primeiro a vincular sonhos lúcidos com o fenômeno de falso-despertar. O Filósofo Norman Malcolm, no texto "Sonhando", 1959, argumentou contra a possibilidade de verificar a precisão dos relatórios de sonhos. No entanto, a percepção de que os movimentos oculares realizados em sonhos podem afetar os olhos físicos do sonhador forneceu uma maneira de provar que as ações feitas durante a vida de vigília podem ser recordadas e executadas uma vez em um sonho lúcido. A primeira prova deste tipo foi produzida no final de 1970 pelo parapsicólogo britânico Keith Hearne. Um voluntário chamado Alan Worsley teve o movimentos dos olhos utilizados para sinalizar o início da lucidez, que foram gravadas por uma máquina polissonográfica.

Os resultados de Hearne não foram amplamente distribuídos. O primeiro artigo de revisão por pares, sobre o tema, foi publicado alguns anos mais tarde por Stephen LaBerge na Universidade de Stanford, que independentemente desenvolveu uma técnica semelhante como parte de sua tese de doutorado. Durante os anos 1980, a evidência científica para confirmar a existência do sonho lúcido foi produzida com sonhadores lúcidos que foram capazes de demonstrar aos pesquisadores que eles estavam conscientes de estar em um estado de sonho (novamente, principalmente através de sinais de movimento dos olhos). Além disso, foram desenvolvidas técnicas que têm sido experimentalmente comprovadas para aumentar a probabilidade de alcançar este estado.

Iniciação

Um sonho lúcido pode começar em uma de duas maneiras. Iniciado a partir sonho, quando o sonho lúcido começa como um sonho normal, e o sonhador, eventualmente, conclui que é um sonho. Ou uma iniciação a partir da vigília, na qual o sonho lúcido ocorre quando o sonhador vai de um normal estado de vigília diretamente para um estado de sonho, sem aparente lapso de consciência. O início deste último ocorre quando o dorminhoco entra no sono REM com inteira consciência de si mesmo diretamente do estado de vigília.

Pesquisa clínica e aplicações

Modelo Neurobiológico

O neurocientista J. Allan Hobson tem uma hipótese do que poderia estar ocorrendo no cérebro, enquanto em sonho lúcido. O primeiro passo para o sonho lúcido é reconhecer que se está sonhando. Este reconhecimento pode ocorrer no córtex dorsolateral pré-frontal, que é uma das poucas áreas desativadas durante o sono REM e onde ocorre a memória de trabalho (ou memória de curto prazo). Uma vez que essa área é ativada e o reconhecimento de se estar sonhando ocorre, o sonhador deve ser prudente para permitir que o sonho continue, mas ser consciente o suficiente para lembrar que é um sonho. Enquanto se mantém esse equilíbrio, a amígdala e o para-hipocampal podem ser menos ativados de forma menos intensa. Para a continuidade da intensidade das alucinações oníricas, espera-se que a ponte e a junção parieto-occipital (lobo parietal e occipital) permaneçam ativas.

Tratamento para pesadelos

Tem sido sugerido que pessoas que sofrem de pesadelos poderiam se beneficiar da capacidade de estar conscientes de que estão realmente sonhando. Um estudo piloto foi realizado em 2006, que mostrou que o tratamento de terapia de sonho lúcido foi bem sucedido na redução da frequência de pesadelos. Este tratamento consiste na exposição da ideia, domínio da técnica, e exercícios de lucidez. Não ficou claro quais os aspectos do tratamento foram responsáveis ​​pelo sucesso da superação dos pesadelos, embora o tratamento como um todo tenha sido bem sucedido. O psicólogo australiano Milan Colic tem explorado a aplicação dos princípios da terapia narrativa com sonhos lúcidos, para reduzir o impacto não apenas de pesadelos durante o sono, mas também a depressão, auto-mutilação e outros problemas na vida de vigília. Colic descobriu que o direcionamento preferencial para a vida de seus clientes, conforme identificado durante conversas terapêuticas, poderia diminuir o conteúdo aflitivo dos sonhos, ao passo que os entendimentos sobre a vida — e até mesmo sobre seus personagens — a partir de sonhos lúcidos poderiam ser invocados na vida "real", com importantes benefícios terapêuticos.

Percepção de Tempo

Em 1985, Stephen LaBerge realizou um estudo-piloto que mostrou que a percepção do tempo durante um sonho lúcido é quase a mesma que durante a vida de vigília. Sonhadores lúcidos contaram 10 segundos enquanto dormiam, sinalizando o início e o fim da contagem com um sinal de olho pré-estabelecido medido com a gravação de um eletrooculograma. Os resultados de LaBerge foram confirmados por pesquisadores alemães, em 2004. O estudo alemão, feito por D. Erlacher e M. Schredl, também analisou a atividade motora e descobriu que a flexão dos joelhos levou 44% mais tempo para ser executada enquanto no sonho lúcido. No entanto, um estudo de 1995 indicava que, na Alemanha, os sonhos vívidos podem ter intervalos de tempo variados, em que o sonhador pode controlar o seu comprimento. O estudo foi realizado durante o sono e ao acordar. Eles requeriam que os participantes anotassem os seus sonhos em um diário e registrassem quanto tempo os sonhos duraram.

Consciência e raciocínio

Embora o controle e a consciência do sonho sejam correlacionados, um não exige o outro — LaBerge encontrou sonhos que exibem grande grau clareza, sem a capacidade para o controle, também, em alguns sonhos onde o sonhador está tão lúcido e consciente que poderia exercer o controle, ele simplesmente escolher observar. Em 1992, num estudo realizado por Deirdre Barrett examinou-se que os sonhos lúcidos continham quatro "corolários" de lucidez: saber que é um sonho, que os objetos vão desaparecer depois de acordar, que as leis da físicas não necessitam ser aplicadas e ter memória clara do mundo desperto, e encontrou menos de um quarto de relatos de lucidez que exibiam todas as quatro. Uma categoria relacionada com os sonhos que são, em termos, lúcidos em algum(s) destes quatro corolários, mas sem a percepção de que "eu estou sonhando", também foi relatada. Em um estudo posterior no livro de Barrett, The Committee of Sleep, ela descreve como alguns sonhadores lúcidos aprenderam a lembrar de metas específicas e práticas, tais como artistas à procura de inspiração buscando uma demonstração de seu próprio trabalho, uma vez que se tornaram programadores lúcidos ou computadores procurando um ecrã com o seu código desejado. No entanto, a maioria desses sonhadores teve muitas experiências de não se recordar dos objetivos acordados antes de ganhar esse nível de controle.

Contexto histórico e cultural

Mesmo que tenha vindo à atenção do público em geral apenas nas últimas décadas, o sonho lúcido não é uma descoberta moderna. No início do budismo era uma prática comum entre as pessoas da comunidade monástica. Como preservado no Sūtra, da antiga escola Sarvāstivāda, a respeito da atenção plena — mente alerta ou ainda consciência plena (ing. mindfulness, al. Achtsamkeit, fr. pleine conscience) — sobre o corpo no āgama Madhayama (equivalente a Pali Kayagatasati), onde se afirma que os monges e monjas sob prática devem entender (ter consciência sobre) as quatro posturas e estados de estar dormindo ou acordado.

Documentada desde o século 8, os budistas tibetanos e Bönpos praticavam uma forma de yoga dos sonhos realizado para manter plena consciência de vigília enquanto no estado de sonho. É importante entender que a meditação Dzogchen para consciência plena e o yoga dos sonhos são práticas distintas. A meditação Dzogchen para conscientização (ou consciência plena) também tem sido referida, em termos, com a rigpa (paradoxal consciência não-dual), contemplação e presença. A Consciência Plena durante os estados de sono e sonho é associada com a prática Dzogchen de luz natural. Esta prática só atinge sonhos lúcidos como um efeito secundário — em contraste com o yoga do sonhos, que visa em primeiro lugar o sonho lúcido. De acordo com os professores budistas, a experiência de lucidez nos ajuda a compreender a irrealidade dos fenômenos, que de outra forma seria esmagadora durante o sonho ou a experiência da morte.

Na cultura ocidental, uma carta escrita por Santo Agostinho de Hipona, em 415 dC, sobre a história de um sonhador, Doutor Gennadius, refere-se ao sonho lúcido. O sonhador informou que ele não sabia que estava no mundo dos sonhos, mas o homem a quem conheceu em seu sonho lembrou-lhe sobre isso e disse que a sua experiência era uma prova de vida após a morte.

Um sonhador lúcido que cedo iniciou seus registros foi o filósofo e médico Sir Thomas Browne (1605-1682). Browne era fascinado pelo mundo dos sonhos e descreveu a sua própria capacidade de sonho lúcido em sua Religio Medici: "... ainda em um sonho eu posso compor toda uma comédia, contemplar a ação, aprender as piadas e rir de meu eu-desperto e das concepções do mesmo".

Da mesma forma, Samuel Pepys registrou em seu diário, em 15 de agosto de 1665, um sonho:
"... Eu tinha a minha Lady Castlemayne em meus braços e me foi permitido todo o namorico que eu desejava com ela, e depois sonhei que não poderia estar acordado, mas sim apenas em um sonho".
Marquês d'Hervey de Saint-Denys argumentou que é possível a qualquer um aprender a sonhar de forma consciente. Em 1867, ele publicou seu livro Les Rêves et les moyens de les diriger; observations pratiques ("Sonhos e como orientá-los; observações práticas"), no qual documentou mais de vinte anos de sua pesquisa sobre sonhos.

O termo sonho lúcido foi cunhado pelo autor e psiquiatra holandês Frederik van Eeden em seu artigo, 1913, A Study of Dreams ("Um Estudo dos Sonhos"). Este artigo foi altamente anedotizado e não abraçado pela comunidade científica. Alguns consideram este um equívoco, porque isso significa muito mais do que apenas um sonho "claro ou vívido". O termo alternativo "sonho consciente" evita essa confusão. No entanto, o termo lúcido foi utilizado por van Eeden, no sentido de "ter conhecimento", como na expressão "intervalo lúcido" aplicada a uma pessoa em remissão temporária de uma psicose, em vez de uma referência ao percentual de qualidade da experiência, que pode ou não ser clara e vívida. Na década de 1950, os Senoi, povos caçadores e coletores da Malásia, relataram fazer uso extensivo do sonho lúcido para garantir a saúde mental, embora estudos posteriores tenham refutado essas afirmações.

Um relatório de 2012 feito pela BBC afirmou que "o interesse no sonho lúcido tem crescido nos últimos anos", e corroborou com exemplos de aplicativos que existem para ajudar as pessoas a experimentar o fenômeno. Um aplicativo com tal finalidade foi baixado meio milhão de vezes em seis semanas, diz o relatório.

Outros fenômenos associados

Movimento Rápido dos Olhos (REM)

Quando uma pessoa está sonhando, os olhos se movem rapidamente. A pesquisa científica descobriu que esses movimentos dos olhos pode corresponder ao sentido do olhar do sonhador no cenário do sonho. Isto permitiu treinar sonhadores lúcidos para se comunicar com os pesquisadores, enquanto sonham, através de sinais de movimento dos olhos.

Falso Despertar

Em um falso despertar sonha-se ter acordado. O ambiente em que o sonhador falsamente desperta em muitas vezes é semelhante ao quarto, onde ele/ela adormeceu. Se a pessoa estiver lúcida, muitas vezes acredita que não estão mais a sonhar e começam sua rotina matinal. O sonhador ingenuamente permanece no sonho até que perceba que não está realmente acordado ou até que realmente acorde.

Paralisia do sono

Durante o sono REM o corpo paralisa-se como um mecanismo de proteção para evitar que os movimentos que ocorrem no sonho causem movimentos semelhantes no corpo físico. No entanto, este mecanismo pode ser desencadeado antes, durante ou após o sono normal, enquanto o cérebro acorda. Isso pode levar a um estado onde o dorminhoco que despertou sente-se paralisado. Alucinações hipnagógicas – percepções sensoriais falsas, tão reais que dificilmente são removíveis pela argumentação lógica – podem ocorrer neste estado, especialmente as auditivas.

Efeitos da paralisia do sono incluem sensação de peso a pressioná-lo ou incapacidade de movimentar os músculos, ruídos, zumbidos, gritos e breves alucinações hipnagógicas (que ocorrem ao adormecer) ou hipnopômpica (que ocorrem ao acordar). A pessoa pode sentir presenças atrás dela ou pode ouvir sons estranhos. As percepções parecem-se muito com sonhos, possivelmente fazendo a pessoa pensar que ainda está sonhando. Algumas pessoas relatam sentirem um peso no peito, como se alguém ou algum objeto pesado estivesse pressionando-o. Há também pessoas que relatam terem saido do corpo, ou até "flutuar".
Estes sintomas podem durar de alguns poucos segundos até vários minutos e podem ser considerados completamente assustadores para algumas pessoas.

A experimentação da paralisia do sono é uma parte necessária do WILD (wake-initiated lucid dream) – início do despertar do sonho lúcido ou sonho lúcido induzido pelo despertar.

Em projeciologia, este fenômeno natural é chamado de catalepsia projetiva, que são os momentos que precedem ou sucedem a projeção da consciência. Normalmente estamos inconscientes durante a projeção da consciência que ocorre durante o sono do corpo físico, mas alterações no padrão de sono, ou exercícios metódicos podem despertar a lucidez e trazer domínio da projeção da consciência.

Experiência fora-do-corpo

Projeção da consciência, experiência fora-do-corpo (EFC), experiência extracorporal, desdobramento espiritual, emancipação da alma, projeção astral ou viagem astral é uma experiência tipicamente subjetiva, descrita muitas vezes como próxima à sensação corporal de estar flutuando como um balão, e, em alguns casos, conforme relatos, havendo a possibilidade de estar vendo o próprio corpo físico, olhando-o sob o ponto de vista de um observador, fora do seu próprio corpo (autoscopia). Cerca de uma em cada dez pessoas pensa já ter tido uma experiência fora-do-corpo em algum momento de sua vida. Os cientistas ainda estão aprendendo sobre o fenômeno. Alguns estudos de neurologistas sugerem que tais experiências são geradas pelos mesmos mecanismos do cérebro que causam sonhos lúcidos. Apesar de algumas semelhanças em sua fenomenologia e métodos de indução, os estudos de EFC não sugerem uma equivalência entre as EFCs e os sonhos lúcidos.

A lucidez está fortemente associada com estágio de sono REM – caracterizado por uma intensa atividade registrada no eletroencefalograma (EEG) seguida por flacidez e paralisia funcional dos músculos esqueléticos –, mas as EFCs são muito menos consistente, nesta fase a atividade cerebral é semelhante à do estado de vigília produzindo traços de EEG que podem variavelmente se assemelhar com a fase 3 do sono, estado de olhos fechados ou outros estados não-categorizados. Isso pode sugerir que as EFCs percebidas são um tipo de sonho lúcido que acontece em um ambiente de sonho que imita o ambiente real do sonhador, isso fica longe de apoiar a ideia de que de alguma forma consciente o sonhador realmente deixa o corpo e percebe seu ambiente externo enquanto ainda em um estado de sono.

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Durante a maioria dos sonhos, os dorminhocos não estão conscientes de que estão sonhando, não importa o quão absurdo ou excêntrico seja o sonho. A razão para isto ainda não foi determinada, e não parece ter uma resposta óbvia. Houve tentativas de diversas áreas da psicologia para fornecer uma explicação. Por exemplo, alguns defensores da psicologia profunda sugerem que os processos mentais inibam a avaliação crítica da realidade dentro de sonhos.

Certos estudos de fisiologia sugerem que para o cérebro, durante qualquer estado mental, vale o "ver para crer". Se o cérebro percebe algo com grande clareza e intensidade, ele vai acreditar que é real, mesmo quando adormecido. A consciência do sonhador é semelhante à de um sujeito alucinando acordado. Sonhos ou imagens alucinantes desencadeados pelo tronco cerebral são considerados como sendo reais, mesmo que sejam fantasiosos. O impulso para aceitar a experiência como real é tão forte que o sonhador, muitas vezes, inventa uma memória ou uma história para encobrir um evento incongruente ou irrealista no sonho. Por exemplo, "O homem tem duas cabeças!" geralmente não é seguido com "Eu devo estar sonhando!" mas com algo como "Sim, eu li no jornal sobre gêmeos siameses famosos." Outras vezes, haverá uma explicação que, no sonho, faz sentido e parece muito lógica. No entanto, quando o sonhador acorda, ele/ela vai perceber que esta é bastante rebuscada ou mesmo completamente absurda.

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